Rita de Cássia Fucci Amato∗
João Amato Neto∗∗

RESUMO: O objetivo deste artigo é analisar a prática da regência coral, a partir dos conceitos de organização do trabalho e gestão de competências. Os principais aspectos discutidos nesse estudo são: a criatividade, dimensões e níveis do trabalho em corais; competências, habilidades e a formação do regente coral; motivação; liderança; solução de problemas e gestão de recursos humanos. A abordagem metodológica é baseada em uma revisão bibliográfica de caráter exploratório, relacionando a literatura à prática da regência coral. Assim, este estudo visa-se fornecer subsídios para a atuação dos regentes e para a melhora na
compreensão e no desenvolvimento das atividades de direção e organização junto aos grupos vocais.
Pode-se concluir que a compreensão e aplicação de todos esses conceitos são capazes de provocar uma proeminente melhoria na qualidade das atividades desenvolvidas pelos corais.

PALAVRAS-CHAVE: regência coral; gestão de recursos humanos; organização do trabalho; gestão de competências; liderança; motivação.

INTRODUÇÃO
O coro é uma organização com fins diversos, desde a busca por motivação pessoal,
educação musical e oportunidades de lazer até a apresentação de uma mensagem ou de um
repertório, e a divulgação de uma instituição. Na sua mais abrangente concepção, a
formação e a atuação de regentes corais deve abarcar os princípios musicais, organizacionais e administrativos para o entendimento do coro em suas diversas facetas, contendo conhecimentos de diversas áreas. Desse modo, o estudo de técnicas de organização do trabalho e gestão de competências/ recursos humanos de um grupo vocal permite, a partir de sua aplicação, o desenvolvimento de relações interpessoais mais agradáveis dentro do grupo e, conseqüentemente, de uma maior eficácia nas atividades do conjunto.
Corroborando com a afirmação de Lüdke e André (1986), de que a investigação de uma
problemática surge em uma ocasião singular, onde o pensamento e a ação do pesquisador
se conjugam no esforço de compor o conhecimento de aspectos reais que poderão ser
Doutora e mestra em Educação (UFSCar), especialista em Fonoaudiologia (UNIFESP) e maestrina (UNICAMP).
Professora da Faculdade de Música Carlos Gomes. E-mail: fucciamato@terra.com.br
Professor titular do Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (POLI-USP), professor e consultor da Fundação Vanzolini. E-mail: amato@usp.br
futuramente utilizados na solução de questões cotidianas, essa pesquisa constitui-se em uma busca por oferecer aos regentes corais uma melhor percepção das relações presentes em seu grupo, gerando subsídios e propostas para a solução de problemas muitas vezes presentes no trabalho com um coro.
Dessa forma, busca-se fornecer uma visão exploratória do tema investigado, relacionando os conceitos de motivação, liderança, organização do trabalho e gestão de competências à regência coral.
A utilização desses conceitos justifica-se pelo fato do coro depender essencialmente de seus recursos humanos (coralistas) e desenvolver suas atividades tendo
em vista a concretização de projetos (apresentação de determinado repertório e organização de concertos). Quanto à natureza dos dados e às fontes de informação utilizadas nessa investigação, procura-se manter o caráter qualitativo, a partir de uma revisão de literatura que permita o desenvolvimento dos temas abordados, inter-relacionando-os.

1. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EM CORAIS
O coro constitui-se em significativa ferramenta para o estabelecimento de uma densa rede de configurações sócio-culturais por meio da valorização da participação individual no processo de construção de ideais e objetivos comuns, culminando com a concretização das atividades grupais. Nesse sentido, como um grupo em busca de objetivos comuns, os participantes de um coral dedicam-se ao estudo com afinco e se submetem a uma atividade musical disciplinada, tendo em vista o resultado almejado pelo mesmo, configurando um carisma grupal:
[...] os grupos dominantes com uma elevada superioridade de forças atribuem a si
mesmos, como coletividades, e também àqueles que os integram, como famílias e os
indivíduos, um carisma grupal característico. Todos os que “estão inseridos” neles
participam desse carisma. Porém têm que pagar um preço. A participação na
superioridade de um grupo e em seu carisma grupal singular é, por assim dizer, a
recompensa pela submissão às normas específicas do grupo. Esse preço tem que ser
individualmente pago por cada um de seus membros, através da sujeição de sua
conduta a padrões específicos de controle de afetos. (ELIAS e SCOTSON, 2000, p.26-
7)
Segundo Maximiano (2006, p. 27), as “organizações são grupos sociais deliberadamente
orientados para a realização de objetivos, que, de forma geral, se traduzem no fornecimento de produtos e serviços”. Neste sentido, as pessoas são o principal recurso das organizações, agregadas a outros recursos, quer materiais (instalações, espaço, móveis, equipamentos etc.), quer imateriais (tempo e conhecimentos). Vale ressaltar que todas as organizações podem ser desmembradas em processos. No caso particular da constituição de um coro, os processos são: planejamento, organização, liderança, execução e controle.
No cerne de qualquer organização social encontra-se a necessidade de adquirir
competências, que, no caso específico, são as habilidades gerenciais (adquiridas ou
buriladas por meio de experiências e de estudo). Convém ressaltar que a essência do
trabalho do líder de uma organização é tomar decisões. Os papéis gerenciais que envolvem as decisões são os de: empreendedor, controlador de distúrbios, administrador de recursos e negociador (MAXIMIANO, 2006, p. 40).
No tocante às atividades de regente, essas perspectivas são pertinentes e reais: o
regenteempreendedor atua como ponto de partida da organização de seu grupo e também
como planejador de todas as atividades, devendo incluir melhorias na organização e
identificar as possibilidades e oportunidades para um consistente fortalecimento do grupo;
o regentecontrolador de distúrbios age de maneira pontual nos imprevistos, crises e
conflitos; o regenteadministrador de recursos administra o próprio tempo, programa o
trabalho de monitores e assistentes (quando existem) e, por vezes, autoriza decisões
reivindicadas por outras pessoas; e, finalmente, o regente-negociador atua nas situações para estabelecer contratos ou apresentações com empresas ou indivíduos que não fazem parte da rotina de ensaios e concertos.

2. CRIATIVIDADE, DIMENSÕES E NÍVEIS DE ATUAÇÃO DE UM CORAL
A criatividade também consiste em um aspecto de fundamental importância nas
organizações e, mais ainda, nos corais, onde a motivação do grupo também está ligada à realização pessoal dos coralistas, por meio do fomento de sua criatividade e da criação de um ambiente propício a esse desenvolvimento, fatores considerados essenciais para o desenvolvimento processo criativo (WECHSLER, 1993). Para De Masi (2003, p. 677-678):
“Um grupo criativo baseia a sua fecundidade na competência e na motivação dos seus
membros, na liderança carismática capaz de indicar e fazer compartilhar uma missão
inovadora num clima solidário e entusiasta”. A criatividade, portanto, constitui-se como uma habilidade a ser trabalhada em toda e qualquer organização social, sendo um fator de grande relevância para a gestão de recursos humanos.
Segundo Mathias (1986, p. 15), um coral pode ser entendido em várias dimensões:

• Dimensão psicológica: determinada pelo trinômio emoção (resultado da
sensibilização), vontade (motivação interior que leva à superação de obstáculos
individuais e grupais) e razão (constituída pela análise e seleção de elementos
harmônicos que compõem a força interior).

• Dimensão política: determinada pela necessidade de organização do grupo, com a
definição das funções de cada elemento, de meios para seu desenvolvimento e de
objetivos que visem o bem comum.

• Dimensão mística: determinada pela vivência “da unidade, harmonia, beleza,
imanentes ao mais profundo de cada um de nós conduzirá naturalmente à vivência
da Unidade, Harmonia, Beleza que transcendem o nosso espaço interior”.
Vale ressaltar que essas dimensões encontram-se compartilhadas entre os diversos níveis de ação do coral. Assim, tais dimensões podem agir em nível político, social, comunitário, grupal e pessoal, gerando desde oportunidades de inclusão social e integração em dadas comunidades até a realização dos objetivos musicais do grupo e a motivação e aumento da qualidade de vida de cada indivíduo.

Tais níveis de ação de um coro podem ser visualizados por meio da figura a seguir, que propõe a representação da ação gradativa produzida pelo coral, desde o nível micro (pessoal) até o macro (político).

3. COMPETÊNCIAS, HABILIDADES E A FORMAÇÃO DO REGENTE
O termo competência pode ser entendido como um conjunto de conhecimentos, habilidades
e atitudes para que um indivíduo desempenhe diversas atividades e pode ser estimulado por meio da educação formal e informal, da experiência profissional e da rede de configurações sócioculturais a qual pertence. Maximiniano (2006) classifica quatro categorias principais referentes às competências: intelectuais, interpessoais, técnicas e intrapessoais. As competências intelectuais estão presentes na elaboração de conceitos, análises, planejamentos e também na definição de estratégias e na tomada de decisões. Duas competências intelectuais específicas são a habilidade de pensar racionalmente (análise da realidade) e a habilidade conceitual (pensamento abstrato: intuição, imaginação e criatividade). As competências ligadas à liderança de um grupo e suas interfaces no contato
com outras pessoas fazem parte das competências interpessoais (compreensão da
singularidade e diversidade dos indivíduos, do processo de motivação, dos princípios de liderança e de comunicação).
A educação formal e a práxis profissional são as duas grandes vertentes pertencentes às competências técnicas. No tocante às competências intrapessoais encontram-se diversas habilidades, tais como: autoconhecimento, automotivação, auto-análise, autocontrole:

•Entendimento do próprio cargo, de seus requisitos e seu impacto sobre a organização.
•Capacidade de compreender, analisar e controlar o próprio comportamento, em particular as emoções.
•Capacidade de compreender e analisar o comportamento alheio, em particular as emoções alheias.
•Capacidade de aprender com a própria experiência e com a experiência alheia.
•Capacidade de analisar, compreender e desenvolver as próprias potencialidades e superar as próprias vulnerabilidades. (MAXIMIANO, 2006, p. 42)

Todas estas elaborações podem ser discutidas em relação à formação do regente, que
consiste na apropriada conjugação entre as habilidades naturais e conquistadas. Enquanto as habilidades naturais relacionam-se com a formação do indivíduo no seu ambiente familiar e com sua posição socioeconômica, as qualificações adquiridas “são resultado de aprendizado por estudo. Exigem esforço, são racionais, geralmente lógicas e justificáveis através da prática” (OLIVEIRA e OLIVEIRA, 2005).
Segundo Rocha (2004), os principais patrimônios próprios essenciais à regência são a
liderança, o talento musical e a aptidão física. Por outro lado, os patrimônios adquiridos indispensáveis ao regente constituem-se na formação musical, na formação intelectual (que inclui conceitos administrativos, psicológicos, políticos, pedagógicos, filosóficos e outros) e na formação física, fruto de hábitos saudáveis e práticas esportivas periódicas.
Na concepção de Zander (2003, p. 29): “Além de conhecer a tradição da prática coral, a autenticidade na interpretação de seus diferentes estilos, é preciso, sem juízo destes, fazer com que eles sejam não só válidos historicamente, mas também vivos em nossa atualidade”.
Os conhecimentos musicais indispensáveis à direção de corais, conjugados a uma série de habilidades e competências referentes não somente ao preparo técnico musical, mas
também à gestão e condução de um conjunto de pessoas que buscam motivação,
aprendizagem e convivência em um grupo social, permite uma abordagem dos diversos
aspectos do grupo, concretizando a aprendizagem musical, o desenvolvimento vocal, a
integração e a inclusão social (FUCCI AMATO, 2005). O papel que um regente tem na
condução de seu grupo musical envolve capacidade de liderar o grupo e motivar cada um
de seus componentes, levando-os a uma vivência musical realmente proveitosa do ponto de vista pessoal e comunitário.

4. MOTIVAÇÃO
A motivação é um processo contínuo em que fatores de diversas naturezas atuam no
indivíduo, a partir da concretização de seus desejos. Para Maslow (apud MAXIMIANO,
2006), a motivação ocorre a partir do cumprimento das necessidades (básicas, de
segurança, de participação, de estima e de auto-realização) do indivíduo, como mostra a figura a seguir.
A partir da análise do esquema acima, podemos incluir o canto coral em um cenário de
qualidade de vida e equilíbrio social. Assim, após o cumprimento das necessidades básicas e de segurança de dada população, a participação em atividades que promovam o aumento da autoestima e do senso de auto-realização constitui significativo aspecto da formação do indivíduo. Nessa perspectiva, o canto coral pode auxiliar a pessoa no seu crescimento pessoal e, a partir de então, em sua motivação.
Cabe lembrar que a motivação é uma conseqüência da liderança que o regente deve exercer sobre seu grupo. Essa liderança pode ser traduzida em bases de autoridade, que podem ser aplicadas ao regente coral em três níveis (MAXIMIANO, 2006): carisma, autoridade técnica (competência musical e educacional do regente) e autoridade política (condução do grupo com o estabelecimento de metas e bom nível de relacionamento do regente com o coro). Na concepção original, as bases da autoridade são: tradição (costumes), carisma (a pessoa), autoridade formal (organização), competência técnica (perícia) e política (relações interpessoais), conforme Maximiano (2006). Porém, acredita-se que a tradição e a autoridade formal são características mais específicas das organizações, sendo pouco aplicáveis ao coro.

Assim, há a necessidade de que os regentes assumam o papel de facilitadores do trabalho da equipe que coordenam, incentivando o aparecimento de novos talentos, administrando de forma contundente os conflitos que possam aparecer durante a execução do trabalho e acima de tudo, preocupando-se em motivar realmente cada um dos integrantes desta equipe (AGUIAR, ESCRIVÃO FILHO e ROZENFELD, 1998, p. 2)
Outra concepção que cabe destacar é a de Herzberg (apud MAXIMIANO, 2006). Segundo
esse autor, há basicamente duas categorias de fatores determinantes da motivação humana em uma organização de trabalho: a primeira, chamada de “fatores extrínsecos ou
higiênicos”, referese aos aspectos: salário condizente com a tarefa e a função do
profissional, políticas de recursos humanos da organização, estilo de supervisão do
trabalho, relações interpessoais (entre os colegas de trabalho) e as condições ambientais de higiene e segurança do trabalho. A presença de tais fatores na prática gerencial constituiria apenas nas condições básicas para se minimizar o estado de insatisfação dos colaboradores.
Para que houvesse um clima organizacional favorável à consecução dos objetivos da
organização, seria necessário incorporar-se àqueles fatores os chamados “fatores intrínsecos ou motivacionais”. Tais fatores estão intimamente relacionados à natureza do trabalho em si e podem despertar o sentimento de responsabilidade e a percepção de crescimento e de auto-realização do indivíduo.

5. LIDERANÇA, SOLUÇÃO DE PROBLEMAS E GESTÃO DE PESSOAS
Em uma concepção abrangente, a liderança pode ser entendida como um importante
componente para o desenvolvimento de qualquer trabalho envolvido com recursos
humanos, sendo essencial para o desenvolvimento das atividades de um grupo e para a
obtenção dos resultados almejados. O líder tem uma função cada vez mais relevante na
sociedade e na busca por seu desenvolvimento sustentável, já que os grandes líderes
influenciam decisivamente as esferas política, econômica, esportiva e cultural nos mais diversos níveis, desde o local até o mundial (RATTNER, 1999).
Com relação à gestão de recursos humanos, a liderança exerce significativo papel na
organização e condução de grupos de trabalho, conduzindo sua ações e induzindo seu
comportamento (MAXIMIANO, 2006). Essa habilidade é, assim, fundamental para a
condução de um coro, que na maioria das vezes apresenta-se como um grupo bastante
heterogêneo, já que seus integrantes podem possuir diferentes níveis de conhecimento
musical, de formação intelectual, de atuação profissional; assim como podem pertencer a classes sociais distintas e também a diferentes faixas etárias. Com relação à regência coral, sua importância é evidente e tratada por diversos autores como um ponto crucial para a condução do grupo (McELHERAN, 1966; ZANDER, 2003; ROCHA, 2004; OLIVEIRA e OLIVEIRA, 2005).

A gestão de recursos humanos é de fundamental importância para a compreensão da
atuação do líder. Douglas Mc.Gregor (apud CHIAVENATO, 2003), um dos mais famosos
teóricos da chamada “Escola das Relações Humanas”, elaborou uma teoria sobre o
movimento das relações humanas, que pode ser adaptada à concepção que o regente tem a
respeito de seus coralistas e que influencia decisivamente o seu estilo de liderança. A figura a seguir adapta a teoria de Mc.Gregor à regência coral.
As concepções apresentadas são comumente idealizadas pelos regentes corais, que formam seus estilos de liderança a partir das idéias que têm a respeito do coro e de seus componentes. A opção por uma gestão participativa, fundamentada na chamada “Teoria Y” de Mc.Gregor, pode ser entendida com o modelo de gestão dos recursos humanos (coralistas) mais apropriado no sentido de manter em elevados níveis a motivação dos mesmos e, desta forma, viabilizar a obtenção de elevados níveis de performance do coral.

Assim, a liderança pode ser entendida como um processo de gerenciamento de recursos
humanos, fundamentando-se em bases de autoridade, que se estruturam na tradição, no
carisma, na autoridade formal, na competência técnica e nas relações políticas, como
sintetiza a figura a seguir.
A escolha do líder é uma etapa de grande relevância para o grupo, podendo ser autocrática, democrática ou liberal. Esse líder também poderá atuarl de acordo com esses princípios, e assim, gerar resultados diversos no trabalho desenvolvido pelo grupo. Dessa forma, quando o líder é imposto ao grupo, costuma também impor suas idéias (liderança autocrática); quando há a liderança democrática, o grupo escolhe seu líder e toma decisões de comum acordo; já quando o grupo não possui líder e toma decisões por “consenso”, há a liderança liberal, ou ausência de liderança (MAXIMIANO, 2004, p. 276).
Assim, a atuação do regente também pode classificar-se de acordo com as atitudes de
liderança por ele tomadas, como sintetiza o quadro a seguir.
A partir da análise do quadro acima, pode-se concluir que, enquanto o regente autoritário aparentemente busca a sua realização, impondo objetivos ao coro e não permitindo sugestões no processo de produção artística, o regente inovador busca, mantendo a organização do grupo, ouvir as idéias de seus integrantes e integrar o grupo sem fazer uso excessivo de sua autoridade. A liderança apresenta-se assim em uma visão bidimensional, apresentando ênfase nas pessoas (recursos humanos) ou nas tarefas (produtos), como expõe Maximiano (2004).
Bergamini (1994, p. 179), todavia, ressalta que: Já é fora de dúvida que diferentes estilos de liderança acham-se enraizados e, portanto, nascem das diferenças individuais de personalidade. Sabe-se que essa maneira de ser faz parte integrante da personalidade de cada um, incluindo não somente as características intelectuais como também as emocionais, as experiências vividas, as expectativas e motivações. Embora não se tenha certeza de que sejam conhecidas todas as variáveis intrínsecas e extrínsecas capazes de determinar esta ou aquela orientação comportamental, pode-se, isto sim, observar o comportamento aparente dos diferentes líderes.

Um outro aspecto de grande relevância na atuação de um líder é a liderança situacional.
Esse conceito postula que diferentes situações exigem formas diversas de atuação, em que o líder utiliza vários tipos de conhecimento e de características distintas (BERGAMINI, 1988). Para Rocha (2004), a resolução de problemas em um coro pode ser resumida em três etapas, segundo essa abordagem:

• Reconhecimento do conflito e de suas fontes: o regente deve avaliar se o conflito
está sendo provocado pelo inchamento de egos, por diferenças na qualidade e na
produtividade musical entre indivíduos ou por boatos e fofocas.

• Reflexão, definição e aplicação de soluções para os conflitos: o regente deve
procurar nivelar os indivíduos e seus níveis de produção e, utilizando-se de sua
habilidade de comunicação, esclarecer os boatos, fornecendo informações
completas sobre o fato.

• Ação preventiva: o regente deve desenvolver forte atividade de comunicação com o
grupo, empreendendo pesquisas sobre o grau de satisfação dos coralistas e buscando
realizar uma gestão participativa dos processos na qual prevaleça o consenso.

A liderança situacional, ao lidar com aspectos sensíveis como a resolução de problemas pessoais dentro do grupo, apresenta estilos de gerenciamento e solução de problemas apropriados aos diversos níveis de maturidade dos liderados (coralistas).
Pode-se então concluir que a efetivação do processo liderologista (formação de lideranças)

pode acontecer no coral por meio das seguintes ações: definição das responsabilidades de cada um; determinação dos níveis de autoridade de acordo com as responsabilidades; estabelecimento de padrões de excelência; educação musical e vocal que satisfaça aos objetivos delimitados; informação e avaliação contínua sobre o desempenho de cada coralista e do grupo; reconhecimento dos trabalhos desenvolvidos e das realizações; confiança entre os membros do grupo; permissão para o erro e motivação para o acerto; tratamento das pessoas com dignidade e respeito.
Para Rocha (2004), o regente também deve possuir outras habilidades para liderar o coro e seus integrantes, tais como a autoridade pessoal, o autodomínio, a clareza de objetivos e de expressão do pensamento, a capacidade de planejamento, empatia e capacidade de mobilização e poder de argumentação. A inteligência emocional também se insere nessa perspectiva, tendo papel fundamental na execução dos projetos do grupo, na medida em que desenvolve o controle das emoções por parte do regente e dos coralistas – melhorando as relações interpessoais e minimizando a ocorrência de conflitos no coro – e permite que os sentimentos individuais sejam canalizados para o cumprimento das metas do grupo (GOLEMAN, 1995). Cabe ressaltar que as habilidades têm diferentes níveis de relevância em função das fases do projeto. No âmbito coral, a preparação de um concerto, por exemplo, apresenta diferentes etapas e, em cada uma destas, determinadas habilidades são requeridas em maior ou menor proporção. O desenvolvimento dessas habilidades pelo regente coral proporcionará, decerto, uma grande melhoria nas atividades de seu grupo e desenvolverá novas relações interpessoais entre seus componentes, resultando em um aumento da qualidade da sua produção musical.

Concluindo-se, a partir da liderança do regente, os coralistas passam a se automotivar. Nas palavras de Bergamini (1994, p.195):
Passa-se, então, a supor que cada um tenha dentro de si recursos pessoais que lhe
permitem manter o seu tônus motivacional bem como gerir-se a si mesmo de maneira a
não permitir que nenhum desvio administrativo venha a drenar esse reduto importante
de forças produtivas. A pessoa intrinsecamente motivada se autolidera sem necessidade
que algo fora dela a dirija. Seria possível, então, afirmar que estando intrinsecamente motivada, a pessoa seja o líder de si mesma.

CONCLUSÕES
O regente de um coral, no papel de liderança de um grupo social e de condução de um
trabalho artístico que envolve um grupo diversificado como um coral, deve ter a capacidade de estabelecer critérios, motivar cada um de seus liderados (coralistas) e levá-los a uma meta estabelecida. A partir desse processo, pode-se gerar e difundir conhecimentos musicais e vocais, estimulando o aumento da qualidade de vida dentro de uma organização ou comunidade e buscando um crescimento gradativo e constante do conjunto, tanto em nível musical e artístico, quanto em nível social.
A compreensão dos diversos níveis de ação de um coro e o estabelecimento de metas e
papéis no processo de criação e (re)produção artística são também imprescindíveis para a eficiência do grupo. Cabe ressaltar que tal processo somente pode ser concretizado a partir da união do conjunto em torno de objetivos comuns, exigindo, assim, a atuação do regente como um líder que, ao conjugar sua autoridade a um processo de gestão participativa, obtém os resultados almejados junto aos seus liderados, para os quais a motivação constitui o elemento-chave para a geração de interesse e compromisso com a atividade praticada.
A partir desse trabalho, visualizou-se que a capacidade de organização do trabalho e gestão de competências dentro da atividade coral, dentre outros aspectos abordados, consistem em habilidades a serem desenvolvidas pelos regentes, tendo em vista que o coro, como uma organização, envolve uma densa rede de relações interpessoais, que deve ser construída por uma política dinâmica e participativa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Henrique. Desenvolvimento de habilidades de liderança: mito ou realidade? In:
ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO (ENEGEP), 18., 1998,
Niterói. Anais. Rio de Janeiro: UFF/ ABEPRO, 1998. p. 1-8.
AMATO NETO, João. Organização e motivação para produtividade. São Paulo: FCAV/
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BERGAMINI, Cecília Whitaker. Psicologia aplicada à administração de empresas:
psicologia do comportamento organizacional. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1988.
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CHIAVENATO, Idalberto. Administração de Recursos Humanos – Fundamentos
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DE MASI, Domenico. Criatividade e grupos criativos. Tradução de Lea Manzi e Yadyr
Figueiredo. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.
ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das
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Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
FUCCI AMATO, Rita de Cássia. Educação musical: o canto coral como processo de
aprendizagem e desenvolvimento de múltiplas competências. In: ENCONTRO ANUAL
DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL (ABEM), 14., Belo
Horizonte, 2005. Anais – Educação Musical e Diversidade: espaço e ações profissionais.
Belo Horizonte: ABEM/ UEMG, 2005. p.1-6.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Tradução de Marcos Santarrita. 14 ed. Rio
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LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens
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MATHIAS, Nelson. Coral: um canto apaixonante. Brasília: Musimed, 1986.
MAXIMIANO, Antonio Carlos Amaru. Introdução à administração. 6 ed. São Paulo:
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McELHERAN, Brock. Conducting technique for beginners and professionals. New
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OLIVEIRA, Marilena de; OLIVEIRA, José Zula. O regente regendo o quê? São Paulo:
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RATTNER, Henrique. Liderança para uma sociedade sustentável. São Paulo: Nobel,
1999.
ROCHA, Ricardo. Regência: uma arte complexa: técnicas e reflexões sobre a direção de
orquestras e corais. Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2004.
WECHSLER, Solange Múglia. Criatividade: descobrindo e encorajando: contribuições
teóricas e práticas para as mais diversas áreas. Campinas: Psy, 1993.
ZANDER, Oscar. Regência coral. 5 ed. Porto Alegre: Movimento, 2003.


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Artigo da revista abem n 11 setembro de 2004

Beatriz Ilari
Kamile Levek
Angelita Vander Broock
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
beatrizilari@ufpr.br

Em nenhuma época houve tanto interesse acerca das relações entre o desenvolvimento cognitivo e a educação infantil. Descobertas recentes nos campos da neurobiologia e psicologia infantil vêm fomentando a elaboração de teorias múltiplas a respeito
da importância dos estímulos e das experiências no desenvolvimento cognitivo humano (Antunes,2003; Gardner, 1983; Herculano-Houzel, 2003).
Tais avanços científicos têm obviamente influenciado a educação musical, e, sobretudo, a educação musical infantil (Ilari, 2003). Como resultado disso, várias
teorias vêm sendo formuladas para explicar os processos e mecanismos envolvidos no desenvolvimento cognitivo-musical (Hargreaves, 1986; Hargreaves;
Zimmerman, 1992; Sinclair, 1989).
Com exceção da Teoria Espiral de Desenvolvimento Musical de Keith
Swanwick (ver Hentschke, 1996; Oliveira, 1996; Sinclair, 1989), ainda há pouca bibliografia sobre o tema disponível em língua portuguesa. Entretanto,
há livros recentes que fazem menções, ainda que de forma indireta, às teorias do desenvolvimento cognitivo-musical. Os três livros aqui resenhados
versam sobre as relações entre o desenvolvimento cognitivo e a educação musical infantil. Por terem implicações diretas e óbvias para a educação musical
infantil, da formação do professor à prática em sala de aula, cada livro foi resenhado em separado, considerando-se três parâmetros básicos:
1) conteúdo e organização do mesmo;
2) contribuições e implicações para a educação musical;
3) relevância para a formação do profissional de educação musical
infantil.

BRÉSCIA, Vera Pessagno. Educação musical: bases psicológicas e ação preventiva. Campinas: Átomo, 2003.

O livro engloba diversos aspectos que instigam a reflexão de educadores musicais. A Primeira Parte aborda temas como a natureza da música e suas origens, as funções da música na sociedade, os efeitos da música no ser humano, questões de interdisciplinaridade (música e psicologia, psicoterapia e saúde) e questões relativas ao ensino e aprendizagem musicais, entre outras. A autora
obviamente revisou uma extensa bibliografia, nacional e estrangeira, para escrever essa parte do livro.
Porém, uma crítica que pode ser feita refere-se ao fato da revisão de literatura ser demasiado pontual e pouco aprofundada. Caso o leitor tenha um interesse
em particular por algum dos temas supracitados, este deverá buscar informações em outras fontes, citadas no texto. Nesse sentido, a revisão de literatura
proposta por Bréscia é apenas introdutória. A partir do item 14, a autora discute a questão da educação musical no Brasil, o que merece bastante atenção
do leitor por sua relevância e importância. Sabe-se hoje que o ensino de música nas escolas brasileiras é bastante desigual, e muitas vezes precário ou inexistente, sendo necessária, portanto, a reflexão e análise das maneiras como a música e as
demais artes estão sendo e deverão ser ensinadas nas escolas brasileiras. A primeira parte do livro traz à tona essa e outras questões que são de interesse
de educadores em geral.
A Segunda Parte apresenta uma pesquisa do tipo survey realizada com crianças e adolescentes participantes do Projeto Guri; projeto social paulista
relacionado ao ensino de música. A autora fundamenta seu trabalho na importância dos projetos sociais, inclusive na função preventiva e no valor da
música no desenvolvimento infantil. A pesquisa aqui descrita foi realizada através da aplicação de questionários aos alunos e professores do projeto, bem
como especialistas de educação musical, externos ao projeto. Os resultados sugeriram respostas bastante positivas com relação aos benefícios que o Projeto Guri traz aos alunos. Nesse ponto, a pesquisa mostrou-se muito interessante. Porém, há algumas
críticas quanto à análise das respostas. Em primeiro lugar, seria pertinente se as respostas de crianças e adolescentes (de 8 a 18 anos de idade)
fossem categorizadas e analisadas em separado (por faixas etárias), já que crianças e jovens são bem diferentes em seu desenvolvimento cognitivo e musical.
Sendo assim, o estabelecimento de faixas etárias resultaria em uma comparação mais sólida das respostas de crianças e adolescentes. Além disso, os
números exatos dos participantes por idade e gênero deveriam ter sido divulgados. Em segundo lugar, é preciso destacar que, de maneira geral, a análise
estatística foi feita de forma bastante descritiva, usando apenas freqüências e porcentagens. Seria interessante que a autora tivesse aplicado alguns testes
estatísticos como chi-quadrado para estabelecer relações mais profundas entre as respostas dos participantes e suas características pessoais.
De maneira geral, o livro apresenta alguns tópicos interessantes que merecem ser lidos e estudados por educadores; não apenas por educadores
musicais, mas por todos aqueles que trabalham com a educação infantil.

PEREIRA, Mary Sue. O descobrimento da criança: introdução à educação infantil. Rio de Janeiro: Wak,2002.

Como o próprio nome diz, o objetivo desse livro é o de fornecer ao leitor uma introdução aos principais temas da educação infantil. Embora o tema
central do livro não seja o desenvolvimento cognitivomusical, o tema é abordado em um dos capítulos, como será visto mais adiante. Dividido em sete capítulos,
Pereira traz uma revisão boa, porém sucinta e, em alguns momentos, pouco aprofundada da história e do desenvolvimento da educação infantil. No primeiro capítulo, a autora apresenta os objetivos do livro, faz um breve histórico da educação infantil –
dos povos primitivos aos tempos atuais – e faz menção aos precursores (Rousseau, Pestallozzi, Froebel, Montessori, Dewey, Claparéde, Piaget, Ferreiro e
Vygotsky). Há uma pequena falha nesse capítulo quando a autora faz referência aos estágios piagetianos. Por alguma razão desconhecida, a autora fala em três e não quatro estágios de desenvolvimento, e não cita o primeiro deles, isto é, o estágio
sensório-motor. Contudo, já no próximo capítulo ela retoma o assunto, dessa vez falando em quatro estágios piagetianos. Essa falha é perigosa porque pode
gerar uma certa confusão no leitor que se ativer ao primeiro capítulo (como ocorre freqüentemente no ensino superior, onde os docentes escolhem capítulos
ou partes de livros para comporem o material usado em cursos). No segundo capítulo a autora discorre sobre a descoberta da criança, falando inicialmente
da história e evolução da instituição família, incluindo questões de gênero e escolarização. Em seguida, são apresentadas algumas noções pontuais
do desenvolvimento infantil nos campos afetivo, cognitivo, motor e social. Embora as noções apresentadas acerca do desenvolvimento infantil sejam pertinentes, a autora não é consistente na categorização dos itens por idades, e não cita as
fontes consultadas. O próximo capítulo, isto é, o número três, versa sobre música, ritmo e movimento.
Com base na noção contemporânea do mundo como um grande objeto sonoro, a autora fala na importância do som e da música, aqui usados como sinônimos, e do corpo como uma importante fonte sonora. É nesse momento que são pontuados certos aspectos do desenvolvimento cognitivo-musical, alguns apresentando um pequeno equívoco, como,
por exemplo:
A primeira e mais elementar resposta da criança a um estímulo é o de bater palmas. Quando, no primeiro ano de vida, a criança está brincando com sua mãe,
devemos observar se o movimento de bater palmas está acontecendo de maneira correta.(p. 75).
O problema da afirmativa acima é conceitual. As pesquisas da educação musical infantil e da psicologia cognitiva da música já demonstraram que as
primeiras respostas de uma criança a um estímulo referem-se à busca do objeto sonoro, através de olhares ou viradas de cabeça, e ao movimento corporal
não coordenado. A criança pode balançar o corpo, mexer as pernas, e até bater palmas, mas isso dificilmente ocorrerá de forma sincronizada ao pulso ou,
o que a autora designa, de maneira “correta” (ver MacDonald; Simons, 1989). Porém, há várias afirmativas pertinentes nesse capítulo, como a importância
do professor conhecer a tessitura vocal das crianças ou a apreciação musical através da expressão corporal. A autora ainda fala na importância da bandinha musical, atividade educacional que esteve muito em voga no passado, mas que vem sendo
paulatinamente substituída por outras atividades na musicalização infantil moderna. O capítulo seguinte,de número quatro, também é bastante pertinente à educação musical porque parte da discussão sobre o valor do jogo e do brinquedo para introduzir a questão do currículo. Do ponto de vista da formação
prática do professor, talvez este seja o melhor capítulo de todos no livro de Pereira. É aqui que são tratadas as questões referentes ao currículo e à escolha
de atividades, que a autora categoriza como criativas, de discriminação, de organização e operatórias.
Em seguida, no Capítulo 5, são abordadas as questões referentes às artes visuais na educação infantil. Assim como foi feito no Capítulo 3 com o desenvolvimento cognitivo-musical, as etapas do grafismo infantil são abordadas aqui de forma bastante pontual, porém, novamente, sem fazer referências às fontes consultadas. É interessante notar que a autora faz grande uso do termo criatividade quando
fala das artes visuais, embora não apresente uma definição do mesmo para o leitor. No capítulo seguinte, a autora descreve alguns projetos em educação infantil e parte destes para discutir a questão da qualidade do ensino. É ainda nesse capítulo que as
contribuições da antropologia e da psicologia da educação infantil são apresentadas, e autora retoma algumas tendências e métodos de ensino baseados em Montessori, Dewey, Piaget e Freinet. Ao final do capítulo há uma retomada da questão dos projetos
de trabalho, com a apresentação de uma tabela bastante confusa acerca das diferenças entre as maneiras de organizar o conhecimento escolar, e da proposta de ensino temático. O último capítulo, que é bastante sucinto, versa sobre a avaliação e apresenta algumas propostas práticas para o professor. De uma forma geral, o livro de Pereira faz jus ao título, já que é bastante panorâmico e pouco aprofundado.
Como ficou dito, os Capítulos 1 e 4 são, em nossa opinião, os melhores de todo o livro; o primeiro por apresentar uma introdução leve à história e ao desenvolvimento
da educação infantil, e o quarto por apresentar excelentes dicas práticas e de organização ao professor iniciante. Porém, os capítulos sobre o ensino das artes deixam a desejar na medida em que tendem a tratar o ensino da música e das
artes visuais como um meio e não um fim. Uma questão interessante que emerge com relação ao ensino das artes refere-se ao uso do termo “criatividade”;
termo que, no contexto do livro, aparece apenas no capítulo sobre as artes visuais. Sabe-se hoje que a criatividade é fator preponderante na educação infantil
como um todo, e que emerge já na infância nas mais diversas áreas de conhecimento, inclusive no ensino e aprendizagem musicais (ver Gardner, 1983; Hargreaves, 1986; Hargreaves; Zimmerman, 1992).
Levando em consideração o fato desse livro objetivar uma introdução ao desenvolvimento infantil e não ao desenvolvimento musical propriamente dito, é possível que a questão da criatividade em música tenha sido deixada de lado propositalmente. O professor de música pode aproveitar muitas idéias oferecidas
por Pereira, mas deve ter em mente que está diante de um livro que não se esgota em si, mas que, como o próprio nome diz, é uma introdução que sugere a
busca de outros.

SUZIGAN, Geraldo de Oliveira; SUZIGAN, Maria Lucia Cruz. Educação musical: um fator preponderante na construção do ser. São Paulo: G4 Editora, 2003.

O livro escrito pelos professores do Centro Livre de Aprendizagem Musical (CLAM), publicado inicialmente em 1996 pela CLR Balieiro, chega agora à sua quarta edição, pela Editora G4. Embora não seja um lançamento, entendemos ser este um livro bastante
importante, em língua portuguesa, para os educadores interessados no desenvolvimento cognitivomusical infantil. Daí a importância de resenharmos o mesmo. O livro é dividido em 11 capítulos que versam sobre a educação musical e a proposta curricular
para a educação infantil; princípios metodológicos, avaliação e observação; a identidade de professor de música; bases psicológicas; os benefícios
extramusicais do aprendizado musical; a nova escola; a educação musical dos 3 meses aos 12 anos de idade, entre outros. Além disso, os autores apresentam
mapas instrucionais com sugestões de atividades de ensino desenvolvidas pelo CLAM, bem como alguns exemplos de músicas do folclore brasileiro re-harmonizadas para uso em sala de aula. De maneira geral, o livro é muito bem redigido e organizado.
Entretanto, há alguns comentários que não podemos deixar de fazer. No Capítulo 7, por exemplo, os autores discutem a educação musical dos 3 meses aos 4 anos de idade, ignorando os dados recentes das pesquisas em psicologia da música, que sugerem que a educação musical do ser humano no tem início ainda no útero materno. Não há menções
ao ensino de música de recém-nascidos ou menores de 3 meses, área bastante explorada hoje pelos grandes centros mundiais de educação musical infantil. Um segundo comentário refere-se à discussão proposta no Capítulo 5, a respeito da educação
musical como elemento facilitador da alfabetização e do raciocínio lógico-matemático. Apesar da discussão ser pertinente e relevante, é preciso salientar
que em nenhum momento os autores dizem que ainda não há, por exemplo, relações causais definitivas entre o aprendizado musical e o raciocínio
lógico-matemático. Embora nos pareça bastante razoável que o ensino de música produza benefícios extramusicais que podem ser transferidos para
outras áreas de conhecimento, este é um assunto polêmico que vem gerando uma quantidade enorme de generalizações incorretas ao redor do mundo (ver Ilari, 2003). Sobretudo, gostaríamos de salientar que a educação musical infantil tem importância em si; é um fim e não um meio. Entretanto, o livro de Suzigan e Suzigan é bastante rico de idéias e altamente recomendável.

Referências:
ANTUNES, Celso. As inteligências múltiplas e seus estímulos. Campinas: Papirus, 2003.
GARDNER, Howard. Frames of mind: the theory of multiple intelligences. NewYork: Basic Books, 1983.
HARGREAVES, David J. The developmental psychology of music. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.
HARGREAVES, David J.; ZIMMERMAN, Marilyn P. Developmental theories of music learning. In: HANDBOOK of Research on Music
Teaching and Learning. New York: Schirmer Books, 1992. p. 377-389.
HENTSCHKE, Liane. Um estudo longitudinal aplicando a teoria espiral de desenvolvimento de Swanwick com crianças brasileiras da
faixa etária de 6 a 10 anos de idade: pólo Porto Alegre. In: MÚSICA: pesquisa e conhecimento. Porto Alegre: UFRGS, 1994. v. 2, p.
9-34.
HERCULANO-HOUZEL, Suzana. Sexo, drogas, rock ‘n’ rol e chocolate: o cérebro e os prazeres da vida cotidiana. Rio de Janeiro:
Vieira e Lent, 2003.
ILARI, Beatriz. Research on music, the brain and cognitive development: Addressing some common questions of music educators.
Music Education International, Nedlands, v. 2, p. 49-54, 2003.
MCDONALD, Dorothy; SIMONS, Gene. Musical growth and development: birth through six. New York: Schirmer, 1989.
OLIVEIRA, Alda. Um estudo longitudinal aplicando a teoria espiral de desenvolvimento de Swanwick com crianças brasileiras da
faixa etária de 6 a 10 anos de idade: pólo Salvador. In: MÚSICA: pesquisa e conhecimento. Porto Alegre: UFRGS, 1994. v. 2, p. 35-
67.
SINCLAIR, Hermine. A produção de notações na criança: linguagem, número, ritmos e melodias. São Paulo: Cortez, 1990.

Recebido em 14/06/2004
Aprovado em 19/07/2004


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(do modelo dominador para o modelo de parceria)
José Antônio Leite Teixeira

Resumo

O presente artigo aborda a importância da inclusão da educação musical na necessária re-elaboração dos currículos escolares brasileiros, buscando uma mudança de paradigmas (do modelo dominador para o modelo de parceria). A música precisa ser vista como forma de conhecimento com suas especificidades, ou seja, uma disciplina autônoma com conteúdos capazes de fazer a integração entre as diversas matérias escolares. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, através dos Temas Transversais, podem servir como indicadores para estas discussões setoriais e gerais, com vistas a uma integração cada vez mais significativa dos conteúdos escolares. Referenciais teórico-metodológicos aplicados à música podem lançar luzes nesta nova procura por práticas pedagógicas não discriminatórias, em busca da melhoria da qualidade da educação na escola, num ensino conectado e holístico.

Palavras-chave: Educação musical, Modelo de parceria, Curriculo escolar

Introdução

As crianças do amanhã ouvem, cantam e tocam canções celebrando a vida e a natureza, nunca entoando hinos de guerra como as de hoje. Durante as aulas com o professor Fialho, a certeza de estar no caminho certo: toda mudança passa pela educação. Precisa-se buscar a reconstrução do modelo educacional baseado na parceria, onde o sentimento fundador é a emoção; o amor. Igualdade de gênero, empatia, entendimento, curiosidade, inteligências múltiplas, ensino conectado, holístico... tudo isso depende, segundo Riane Ficher (no livro Tomorrow´s Children), de uma mudança de três marcos: o processo (como ensina-se), o conteúdo (o que ensinamos) e a estrutura ( como reparte-se poder e tarefas). A música pode ter papel fundamental nesta mudança de paradigma, atuando nestes três marcos.
É sabido que a educação acontece na escola, através do ambiente familiar, da religião e dos meios de comunicação de massa. Mas é na escola que centraremos o foco deste trabalho. Já tendo feito parte do Quadrívio (junto com a Astronomia, Aritmética e a Geometria - enquanto o Trivio era composto pela Retórica, Gramática e Dialética), a Música foi relegada quase ao esquecimento após a Revolução Industrial, pelo menos enquanto importante ferramenta educacional. Principalmente nos últimos anos, aqui no Brasil. Para entendermos um pouco mais a este respeito, um rápido resumo do papel da música nas escolas brasileiras no último século.

Desenvolvimento

1. Breve histórico

O movimento do Canto Orfeônico, idealizado e desenvolvido por Villa-Lobos a partir da década de 30, pretendia unificar a educação musical no sistema educacional brasileiro. Enfatizou uma prática centrada nas idéias de coletividade e civismo, condizentes com o Estado Novo. Na década de 60, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB 4024/61) substitui o Canto Orfeônico pela Educação Musical, baseada no modelo de ensino adotado em conservatórios de músicas, apresentando uma oposição ao ensino da teoria musical mais abrangente e à ênfase nos aspectos matemáticos e notacionais da música. Entretanto, ficou restrita a pontos isolados do território nacional.
Nos anos 70, a LDB 5692/71, que instituiu a Educação Artística como prática polivalente, trouxe sérias implicações para a prática pedagógica. É inconcebível que um indivíduo detenha os conhecimentos específicos de cada linguagem artística em apenas dois anos (no caso da licenciatura curta) e ainda esteja preparado pedagogicamente para ser professor nas áreas de artes plásticas, teatro, música e dança. Sem contar o reduzido espaço no currículo escolar para que o aluno possa aprender as diferentes linguagens. A prática demonstrou a inconsistência desta preposição. Quem ousaria incluir no currículo uma disciplina chamada Línguas, para a qual um mesmo professor devesse dar conta de Português, Inglês, Espanhol e quiçá Francês numa mesma aula de dois ou três créditos por semana?
Com a recente LDB (9394/96) e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), o termo Educação Artística foi substituído pelo Ensino de Artes, e pela ausência do termo polivalência. Porém só a troca de termos não promoveu mudanças. Apesar de já ser praticada como disciplina isolada em uma dúzia de escolas da Prefeitura de Florianópolis, por exemplo, a música ainda está distante de ser considerada uma disciplina com vida própria no currículo escolar brasileiro. Aqui mesmo em Santa Catarina, onde a Universidade Estadual (Udesc) oferece cursos superiores para formação de professores de música, artes plásticas e teatro (ainda não existe nesta instutuição a faculdade de dança), o governo acaba de lançar um concurso para professores de artes, não garantindo a autonomia de cada uma das áreas. O paradoxo continua Brasil afora, não se respeitando as especificidades de cada linguagem.
Ainda é preciso romper com muitas barreiras relacionadas à arte e seu ensino, tanto na comunidade em geral, como nos sistemas educacionais. Nunca se produziu tanto material bibliográfico nas diversas áreas artísticas como nos dias atuais, Tal bibliografia, infelizmente ainda inacessível para a grande parte da população escolar, demonstra a importância da abordagem das diversas áreas artísticas como formas autônomas de conhecimento. As particularidades de cada linguagem podem e devem ser sistematicamente desenvolvidas no âmbito escolar, a fim de reorganizar as propostas e redimensionar o papel das artes no currículo e na vida educacional dos indivíduos.
É por aqui que passa a intersecção possível das mudanças de paradigmas de uma educação baseada num modelo dominante, para uma educação baseada no modelo de parceria. A música pode ser uma forma de atrair crianças para aprender a modificar esta sociedade dominadora, uma ferramenta de inspiração para criar um mundo mais justo e menos violento. Afinal, a aprendizagem ocorre através do desenvolvimento cognitivo (intelecto), afetivo (emoções), conativo (vontade) e do psicomotor (‘soma’; corpo).
No quinto capítulo do livro Tomorrow’s Childrens, Riane Ficher fala da arte em geral, como uma importante forma de expressão humana. Ensinada desta forma desde as séries iniciais, a arte ajuda as crianças a expressar a criatividade e familiarizá-las com outras tecnologias criativas. A autora vai mais além e afirma que a arte pode ser ensinada em todos os níveis escolares e integrar todas as disciplinas, já que as representações artísticas retratam a realidade de diferentes épocas.

2. Vivenciando experiências não verbais

Por mais que a atividade musical esteja diretamente relacionada ao entretenimento, a música na escola precisa assumir um papel relevante enquanto forma de conhecimento e isto só será possível a partir da inclusão da disciplina e da sua continuidade no ensino. É preciso que se aprimorem as organizações curriculares e que cada linguagem artística tenha presença garantida de forma digna e real. Não basta o discurso da mudança de paradigma se ainda os professores das diferentes linguagens artísticas estão à margem do processo escolar, com número de aulas insuficientes, espaços inadequados, desprestígio enquanto mediadores de processos educacionais relevantes.
Nesta busca de re-elaboração dos currículos é preciso estar garantida a presença e continuidade da educação musical, isto é uma questão de tolerância política básica. Afinal, música é uma forma de conhecimento e deve ser respeitada como tal. Em educação musical, deve-se possibilitar a liberdade de trabalho de profissionais com linhas diversificadas de formações musicais, configurando abordagens multiculturais. Desta forma pretende-se tratar com o devido respeito diferentes pontos de vista no desenvolvimento de conteúdos específicos.
Diferentemente de outras áreas já estabelecidas no currículo escolar, a educação musical, que esteve ausente durante tanto tempo, estará se deparando com questões presentes na cultura escolar, onde ensinar música está diretamente vinculado a ensinar um instrumento musical, ou ainda, que só pode aprender música quem tem talento. Estes aspectos do senso comum, infelizmente, também pertencem ao universo de professores de música que, aberta ou veladamente, estabelecem, através de suas metodologias, práticas discriminatórias. O empenho de profissionais da educação terá que ser muito grande, e a argumentação a respeito dos diversos posicionamentos teórico-metodológicos deverá ser clara e firme no sentido de diferenciar práticas pedagógicas diversas, garantidas pela tolerância política, daquelas práticas pedagógicas discriminatórias que não deveriam conviver nesta proposta curricular.
3. Linhas metodológicas

Referenciais teórico-metodológicos estão disponibilizados na literatura através de publicação de autores consagrados internacionalmente, assim como através da produção de autores brasileiros. Dalcroze, Willems, Orff, Kodály, Villa-Lobos, Suzuki, Schafer, para citar os mais conhecidos e aplicados, apresentaram questões significativas para educação musical e podem conviver na prática escolar. Também já estão sendo aplicadas novidades como a teoria espiral do desenvolvimento musical de Swanwick, e a abordagem da musica como cognição de Serafine. Para este autor, a música é uma modalidade de conhecimento distinta e ele procura identificar os processos cognitivos relacionados ao pensamento musical. Também no campo da cognição, são importantes os trabalhos de Gardner relacionados às inteligências múltiplas, onde se inclui uma inteligência musical autônoma.
Ainda na busca de referenciais teórico-metodológicos é de fundamental importância a contribuição da psicologia da música para a educação musical, como os trabalhos de Aiello, Deutsche, Hargreaves, Oliveira, Sloboda, entre tantos outros. A sociologia da música também é uma área recente que muito tem contribuído para a reflexão e compreensão de conceitos de educação musical. Pesquisadores brasileiros, como Arroyo, Souza e Tourinho, têm produzido material importante para os educadores musicais e a prática da música na escola, enfatizando questões conceituais.
Mas a simples utilização dos livros de um autor, ou a tradução do texto de uma canção, ou a adoção de comportamentos próprios de uma cultura distante, não garantem uma educação musical de qualidade, mesmo quando bem intencionada. É extremamente relevante o contexto escolar na sua mais ampla abrangência para o estabelecimento de metodologias adequadas. Aqui também devem estar incluídas reflexões sobre os pressupostos filosóficos e psicológicos de cada método, além de cuidadosa avaliação do contexto onde se pretende desenvolver tais práticas.
Aspecto que merece extremo cuidado é o talento, com seus conceitos e discriminações na área do ensino musical. A literatura de educação musical também dispõe de um grande número de estudos e teses relacionado à mediação de habilidades musicais, e muitas críticas acompanham tal literatura. Não é possível determinar com precisão qual é o grau de musicalidade de um indivíduo. O que se pode identificar são certas facilidades ou aptidões de certos indivíduos, o que não exclui a possibilidade de outros indivíduos “menos aptos” desenvolverem habilidades musicais. Considerar o talento como ponto de partida ou como condição essencial para a aprendizagem musical é fomentar uma educação pela exclusão, é pretender sedimentar a educação musical num plano intangível. É reforçar o modelo dominador.






4. A democratização do acesso e da gestão

Parte-se do princípio de que existe a possibilidade de uma educação musical para todos os indivíduos que freqüentam a escola, assim como se oferece uma educação matemática para todos os indivíduos que participam de um processo escolar.
A escola deve propiciar uma formação mais plena para todos os indivíduos. As mudanças de paradigmas deverão sair do papel para a prática efetivamente. Muito se fala da escola formadora do cidadão mais consciente de si e do mundo, mas ainda se reforça a racionalidade na escola, ignorando que a formação plena do indivíduo também passa pelo desenvolvimento dos aspectos emocionais e sensíveis. A música é uma forma de conhecimento que possibilita modos de percepção e expressão únicos e não pode ser substituída por outras formas do conhecimento.
A democratização do acesso também passa pela música como pertencente ao patrimônio cultural da humanidade e, portanto, pertencente a todos os indivíduos, sem distinção. Nesta linha de pensamento também a educação musical deve se conscientizar de seu papel na cultura escolar, contribuindo para a ampliação do universo sonoro do estudante, incorporando músicas de diferentes épocas e propostas. As questões referentes à música popular, erudita ou folclórica; nacional ou internacional; atual ou antiga; devem compor elementos fundamentais para uma efetiva democratização da música no contexto escolar.
Devemos considerar, ainda, como um aspecto importante para a democratização do acesso aos bens culturais, a manutenção da disciplina de música com carga horária compatível para uma aplicação consciente e significativa da escola, “de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (LDB, Art. 26, § 3°, apud Saviani, 1997, p.171).


Considerações finais

O conceito de escola está constantemente mudando - seja pelas inovações tecnológicas, pelos meios de comunicação de massa, pela informática - e a comunidade escolar deve reivindicar o direito ao conhecimento. Em música não é possível conceber que o conhecimento pode se dar a partir de descrições de termos vagos de significado, ou de teorizações descontextualizadas, ou ainda através de fatos históricos ou anedóticos acerca de música ou músicos. É preciso e é possível incluir música na educação básica. A qualidade e consistência desta atividade só serão possíveis a partir da reorganização da didática da educação musical desde a pré-escola até o ensino médio.
A riqueza musical brasileira não pode ser ignorada na organização do trabalho didático na escola. Mas também a produção musical do mundo pode e deve estar presente na educação musical. É preciso aparar muitos preconceitos e vencer muitas resistências para que se possa construir de fato algo condizente com aquilo que se pode chamar de educação para o terceiro milênio. E a música precisa estar incluída nesta discussão.
Especialistas devem trabalhar conjuntamente, rediscutindo limites e vantagens de suas práticas isoladas, apresentando soluções pedagógicas para tantos desafios decorrentes de uma educação fragmentada que temos vivenciado. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, através dos Temas Transversais, podem servir como indicadores para estas discussões setoriais e gerais, com vistas a uma integração cada vez mais significativa dos conteúdos escolares. A integração horizontal e vertical dos conteúdos se faz absolutamente necessárias nesta proposta de re-elaboração de currículos.
A educação musical pode estar perfeitamente incorporada às atividades educacionais, conservando suas características peculiares. Inserir música às atividades educacionais não quer dizer cantar para decorar fórmulas matemáticas ou datas cívicas, ou ainda cantar para aprender elementos gramaticais de idiomas estrangeiros, como é feito hoje em dia. Mas sim, incorporar efetivamente música como experiência educacional que permita aos indivíduos se relacionarem com esta forma de expressão humana.
Para isto é preciso conhecer mais detalhadamente a realidade escolar, as características das diversas faixas etárias, as perspectivas culturais e educacionais associadas aos conteúdos de cada modalidade do conhecimento presente no currículo escolar. E a música faz parte da cultura, e não pode estar ausente nesta busca pela melhoria da qualidade da educação na escola.


Bibliografia

BRASIL. (1988). Parâmetros Curriculares nacionais (1ª a 4ª séries). Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MAC/SEF.
BRASIL. (1988). Parâmetros Curriculares nacionais: Arte (5ª a 8ª séries). Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MAC/SEF.
FICHER, Riane (199 ). Tomorrow’s Childrens.
Martins, R. (1985). Educação Musical: Conceitos e Preceitos. Rio de Janeiro: FUNARTE.
NOGUEIRA, A. (1997). O modelo da educação musical no Brasil: Um drama em três atos incongruentes. Revista da ABEM, 4, Associação Brasileira de Educação Musical.
OLIVEIRA, A. (1993). Fundamentos da Educação Musical, 1, Associação Brasileira de Educação Musical.
PENNA, M. (1990). Reavaliações e Buscas em Musicalização. São Paulo: Loyola.
SAVIANI, D. (1997). A nova lei da educação: Trajetória, limites e perspedtivas (3 ed.). São Paulo: Autores Associados.
VILLA-LOBOS, H. (1976). Canto Orfeônico. São Paulo: Vitale.


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Debussy: L'après-midi d'un faune

Regido por Leopold Stokowski, com a Orquestra Sinfônica London, Sala Royal Festival , Londres, 14 de Junho de 1972.

"Prélude à l'après-midi d'un faune" de Claude Debussy.

Interpretada por ocasião do aniversário de Stokowski dupla de 90 e 60 º aniversário de sua estréia LSO.

"Prélude à l'après-midi d'un faune" era uma especialidade da Stokowski ao longo dos anos, mas ele e seus solistas se superaram nesta noite, como pode ver.

Christopher Palmer escreveu em "The Musical Times" que "Minha memória mais querida da noite é, sem dúvida," Prélude à l'après-midi d'un faune ", que recebeu uma leitura de refinamento excepcional, com todas as tensões e relaxamentos esforço e belamente classificados, e infalivelmente trabalho solo poético de todos os de sopro de madeira. Um desempenho impecável ".

em "The Daily Telegraph" Peter Stadlen escreveu "mãos lendárias de Stokowski. Seu angulo, quase deselegante nos movimentos são as ferramentas simples para alguns dos mais magistrais em condução do século, foi testemunha .... por aquilo que aparentemente incongruente movimentos do punho ele promover os solos fabulosamente sensíveis no «Prélude à l'après-midi d'un faune" Nunca teve fama mundial ao longo de sua vida repousava sobre bases mais sólidas ".
adaptado do encarte por Edward Johnson

Debussy: Prelude to "A Tarde de um Fauno"





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O rito do espirito - a sa gração da Primavera.


A Sagração da Primavera
de Stravinsky

A Sagração da Primavera? Um monumento inultrapassável, todos o reconhecem hoje em dia; mas não tenho a certeza de que seja melhor compreendida do que no primeiro dia, quando uma elegante parisiense exclamava indignada: "Há 60 anos que aqui venho e é a primeira vez que troçam assim de mim!'' A geral reagia de forma ainda mais violenta. Deixemos que Pierre Monteux nos relate o acontecimento: "... O auditório ficou em silêncio durante dois minutos, depois, de repente, vaias e assobios desceram das galerias, acompanhadas logo em seguida pelas ordens inferiores. Houve espectadores que começaram a discutir e a atirar-se, uns aos outros, tudo o que tinham à mão. Em breve esta cólera se dirigiu contra os dançarinos e depois, ainda com mais violência, contra a orquestra, que era a verdadeira responsável por esta crise musical. As coisas mais variadas foram-nos arremessadas; apesar de tudo, continuamos a tocar..."

Se há algum perturbador, esse é Stravinsky, e a sua música é feita à sua imagem. Duas palavras apenas bastariam para definir a sua personalidade: rigidez e orgulho. Mas os seus amigos, aqueles que o conhecem intimamente, não estariam, sem dúvida alguma, de acordo. O mesmo se passa com a sua música, o que explica a tenacidade dos seus detractores, semelhante ao entusiasmo dos seus amigos. A Sagração da Primavera, quando da sua primeira audição, no Teatro dos Campos Elíseos, em Paris, sob a direcção de Pierre Monteux, em 29 de Maio de 1913, desencadeou violentas polémicas, após ter desencadeado uma batalha nunca vista que prosseguiu na rua. Mas um ano mais tarde, quando Monteux regeu a versão de concerto que actualmente conhecemos, a obra foi considerada genial. De onde vem, pois, a dificuldade da sua compreensão?

Quando se fala de Stravinsky, há que deixar, antes de mais, de considerar a música como uma linguagem, como um reflexo de uma imagem ou de uma emoção. Stravinsky não está na sua música, é apenas ele próprio espectador que descreve em música aquilo que vê ou aquilo que sentem os seus personagens. Talvez seja isso que faz dele um extraordinário compositor para bailado. Ele compõe à maneira de um pintor que trabalha primeiro o desenho e recorre finalmente à cor para animar o seu quadro. A sua música é um pouco como a de Bach (um Bach do século XX): toma um tema, fá-lo evoluir à sua vontade em todas as direcções, tanto simultânea como sucessivamente, e termina com uma obra distinta, totalmente independente e nova, como sucedia quando Bach transformava os Concertos de Vivaldi. São as harmonias de Stravinsky que lhe dão tanta riqueza e novidade; e a sua utilização sobre uma sucessão de ritmos, o seu percurso pelas tonalidades vizinhas, tudo isso despista a análise, chocava o ouvido [em 1913] e ainda hoje nos parece de uma novidade espantosa.

O "cataclismo sonoro... o desenfreamento rítmico e sonoro da Sagração", para retomar os termos de Alexandre Tansman, nasceu de uma visão, que Stravinsky teve quando compunha o Pássaro de Fogo. Retomando um velho rito pagão, ele imaginou uma assembleia de anciães cercando urna jovem que dança até ao esgotamento, símbolo da vida que nasce da morte. Falou disso ao seu amigo Nicolas Roerich, pintor e arqueólogo (responsável pelo décor na estreia) e esboçou com ele o esquema do bailado nas suas duas partes e nas suas diferentes cenas. Falou depois a Diaghilev, também ele logo entusiasmado com a ideia. No início de 1912 a obra estava terminada, restando apenas por fazer a orquestração. Mas Petruchka, a que se lançou por um desejo de variar, veio ocupar a sua mesa de trabalho, e a Sagração foi finalmente concluída em 1913. Após a sua estreia muitos coreógrafos tentaram, com maior ou menor felicidade, depois de Nijinsky, dar vida ao bailado; algumas dessas coreografias são assombrosas. Nenhuma, contudo, partiu do bailado tal como o concebera o próprio Stravinsky, o que é uma pena. Assim concebido serviria maravilhosamente um bailado moderno.

Tentaremos aqui esboçar as grandes linhas de partitura e sublinhar o significado e o desenvolvimento profundo das múltiplas melodias. A obra tem duas partes: l — Adoração da Terra. 2 — O Sacrifício.

ADORAÇÃO DA TERRA

Uma Introdução lenta abre caminho a duas melopeias de apelos, uma meditativa, a outra mais rápida. Já aqui o ritmo começa a impor-se; impulsos subtis, acariciadores, passam através de todos os desenhos orquestrais; poder-se-iam escrever páginas inteiras sobre esta sequência, de tal forma o espírito é absorvido pelos dados da linguagem e da forma, conduzidos com uma segurança soberana e com uma firmeza peremptória. Os augures da primavera e a Dança das adolescentes: Um Staccato admiravelmente construído anuncia-nos que o dia está a nascer. Um motivo ligeiro, se não mesmo etéreo, faz nascer três outros desenhos que encontram em si mesmos o seu significado. Um quadro que nos prende é o do Rapto: sonoridades assustadoras provocam o terror; é então que aparece, em rápidas incursões, toda a desenvoltura da escrita. Pelo contrário, as Rondas primaveris oferecem-nos um momento de meditação sobre tudo o que nos surpreendeu até então. Estamos nesse momento prontos a receber o motivo único que preside aos Jogos das Cidades Rivais. Neles Stravinsky nas sucessivas apresentações desse motivo, faz nascer das notas principais novas melodias. A nossa compreensão ver-se-á tomada e elevada até ao aparecimento do Cortejo do sacerdote; sons profundos parecem sair das entranhas da terra, precipitando-se no meio de um tam-tam obstinado e incisivo. Esta sequência domina-nos de tal forma que ficamos maravilhados pelo seu sentido de equilíbrio estrutural.

O SACRIFÍCIO

Uma introdução majestosa visa colocar-nos num clima estranho; aqui as harmonias são elaboradas com uma substância que é sempre sensível no mistério que as envolve. E então que aparece a cena dos Círculos misteriosos das Adolescentes; este Andante é de certo modo uma via sacra. O destino impõe-se pouco a pouco e o avanço das adolescentes impõe a sua passividade aceite. A dança interrompe-se. Uma das adolescentes é designada pela sorte para o sacrifício. Até à dança sagrada a Eleita permanece imóvel. A atmosfera é entrecortada por acordes desiguais e estranhos. A Glorificação da Eleita contém ritmos muito variados, pondo em primeiro plano um desenho dominante que abrirá as portas à Evocação dos antepassados, quadro que, na sua simplicidade, faz ressaltar todos os recursos preciosos de uma orquestra em constante evolução. Após o Lento da Acção ritual dos antepassados surge finalmente a Dança sagrada; de novo um quadro espantoso em que a juventude retoma os seus direitos, após se ter retido momentaneamente pelo temor dos Deuses mortos. Mas tudo se transforma em brilhantes correntes sonoras que fazem jorrar a seiva primaveril enquanto os augures reencontram a vida através da morte da Eleita.

Mas é necessário reconhecer que as palavras não podem transmitir a força quase encantatória da Sagração da Primavera, partitura genial que é hoje em dia tão inovadora como em 1913.

[Serge BERTHOUMIEUX (Tradução de Rui Vieira Nery). Notas à gravação da USSR Radio

A sagração da primavera
Igor Stravinsky


Filarmônica de Los Angeles
Esa-Pekka Salonen, Regente
October 23, 2003,
Para inauguração da sala de concerto em L.A.

Large Symphony Orchestra, de 1981]










O escândalo de Stravinsky



Se, em 1894, o Prelúdio à sesta de um fauno [obra musical -- impressionista -- de Claude Debussy (nota d'O Canto)] já desconcertara o público e a crítica, o que aconteceu em Paris, em 1913, no decorrer da primeira execução da Sagração da Primavera de Igor Stravinsky foi, na opinião de muitos, o mais célebre escândalo musical que a história recorda. O compositor russo foi imediatamente definido como o «revolucionário por excelência» e a sua obra foi, durante muito tempo, um dos símbolos mais típicos do «moderno» no domínio da música: moderno, no sentido de irritante, chocante, escandaloso. Com o tempo, naturalmente, toda a novidade perde a sua força de embate; todavia, embora a partir de então essa música fosse reconhecida pacificamente como uma obra-prima, conserva ainda para os ouvintes menos aculturados algo do seu original carácter provocatório.

Tentemos fazer renascer, de certo modo, a sua carga criativa; não decerto com a ilusão inútil de reconstruirmos um «ouvido de 1913» mas, pelo contrário, tentando actualizar certos momentos da experiência da época, fazendo-os reagir em contacto com o nosso contexto actual. Pegaremos apenas em alguns motivos da obra porque, na realidade, o que pretendemos aprofundar é, como de costume, a nossa capacidade de audição e de interpretação. Mas, em troca, ainda que a um prazo um pouco mais longo, não se intensificará também a nossa experiência dessa obra?

O próprio Stravinsky conta que, logo aos primeiros compassos, a Sagração foi acolhida com «risadas e troças», depois do que se desencadeou o alvoroço que as crónicas registam. O que haveria de escandaloso naqueles primeiros compassos?
Tratava-se de um simples solo de fagote acrescido de uma melodia popular lituana, certamente desconhecida do público mas que podia ser sugestiva; um andamento rítmico assimétrico e complexo, de livre vocalizo; um timbre instrumental desusado — o fagote em registo agudo — que um célebre professor de orquestração não conseguiu sequer reconhecer, pelo que saiu da sala, horrorizado, protestando que não era aquela a forma de manusear os instrumentos.

Por conseguinte, nada de particularmente cómico; mais ainda, aquele início com um solo de instrumento de sopro tinha um precedente não longínquo na flauta do Fauno de Debussy: uma analogia que se torna bastante fácil, mesmo para nós, gerações posteriores. Mas aqueles sons, exíguos e estranhos, um tanto pesados e guturais, como a voz de um animal desconhecido, devem ter entrado em choque frontal com a dignidade daquele teatro (o Teatro dos Campos Elíseos) e com a expectativa daquele público: era possível que começasse daquela maneira uma obra respeitável, mais, um espectáculo de gala para a melhor burguesia europeia? Primeiro, o contraste provocou hilariedade, e depois surgiram os protestos.

Não arremessemos com demasiada facilidade a primeira pedra contra aquele público. É certo que hoje não reagimos assim perante aquela música; a nós, o início da Sagração pode sugerir imagens primitivas, algo desconcertantes e talvez, para os menos aculturados, vagamente ansiogéneas. Mas perguntemos a nós próprios se, em situações análogas, não reagimos também daquela forma primitiva e um tanto imbecil, que traduz falta de disponibilidade em relação a tudo o que é novo.

Passando a um outro aspecto, uma componente importante do escândalo perante uma proposta cultural, é precisamente aquela que é sentida como um exagero, um excesso. Em face de qualquer coisa que «vai para além de todos os limites», sentimo-nos incomodados, exasperados e acabamos por explodir. O público de 1913 deve ter passado por uma experiência do género, a julgar apenas pelas descrições, já bem decantadas e calibradas, que lemos na crítica recente.

Referindo-se à Sagração, Manzoni, no seu Guia, fala dos «acentos perturbantes e verdadeiramente revolucionários, dos ritmos agrestes reiterados, das estratificações politonais, do instrumental sardónico, da inexorabilidade mecânica de certas páginas» e sobretudo «da força primitiva de um ritmo perturbante, para além da inaudita novidade e variedade dos timbres». Gentilucci confessa-se impressionado com as «melodias folclóricas deformadas, a selvagem articulação rítmica obsessivamente expandida, as durezas harmónicas politonais, a recusa radical do fraseado de longo alcance, os contínuos desvios do acento rítmico, as vertiginosas invenções de timbres», tudo sentido como uma «explosão de vitalidade». Excesso no grande número de instrumentos e, em particular, de instrumentos de percussão; excesso na «fusão dos instintos mais primitivos com a sensualidade mais exacerbada», sublinha o crítico alemão Hans Heinz Stuckenschmidt; e, ainda, excesso na violenta crueza das dissonantes, na dança orgiástica final sotoposta a contínuas mudanças de compasso, nas bruscas passagens do pianíssimo ao fortíssimo, desde fracos acenos melódicos de instrumentos a solo até acordes colossais de toda a orquestra.

A primeira e principal reacção do público, aquando da apresentação da peça, deve ter sido a de quem se encontra perante uma agressão física, biológica, de uma quantidade excessiva de sons, de estímulos acústicos. Poderá parecer estranho mas ainda hoje existem pessoas (quantas?) que têm a mesma impressão quando ouvem a Sagração; afirmam, como se chegou a registar, que, nessa música, «o volume é tão forte que, em certos momentos, chega a provocar aversão» porque chega a ser «um estrondo que desmembra o mais pequeno evento musical»; está-se como que perante uma «simples utilização física do som» que provoca «exaltação, superexcitação».

Sensações deste género também o público as experimenta durante a audição de certas peças contemporâneas de Nono ou de Stockhausen, em que o ruído atinge dimensões insuportáveis, especialmente se a audição é em esterefonia, com quatro altifalantes. Para não falarmos das montanhas de ruídos que os conjuntos rock fazem desabar sobre nós. É a sensação de já não sermos espectadores face a uma mensagem musical que devemos ouvir e interpretar, de nos sentirmos envolvidos e sem a menor possibilidade de nos refugiarmos dentro de um campo vibrante que faz pressão sobre toda a superfície do nosso corpo. Que resposta poderemos dar ao estímulo sonoro? Podemos reagir, defendendo o nosso direito a uma audição cultural, subtraindo-nos à agressão acústica e afirmando que aquela música não é música. Ou então, podemos adaptar-nos à situação, tirando dela o melhor partido possível: mergulhando na experiência do som como som (audição, degustação, exercício de sensação consciente, zen ou yoga); deixando prolongar-se activamente as vibrações dos nervos até aos músculos e começar, por exemplo, a dançar. Como é evidente, o público parisiense da Sagração não tinha em mente estas soluções. Contudo, não deveria ter descurado o facto de que, além disso, aquela música devia ser também dançada.


Uma segunda reacção aos «excessos» na música é do tipo qualitativo. O ouvinte defende-se dos golpes baixos da agressão acústica, mantém essa agressão dentro dos limites razoáveis de uma experiência cultural, reage culturalmente e não visceralmente. Mas a informação continua a ser muitíssimo superior à redundância e apresenta-se como «ruído» cognoscitivo. Em suma, a Sagração está fora de todos os esquemas musicais pré-estabelecidos: não só despreza a linguagem tradicional como parece também não ter qualquer relação com as novas experiências de Debussy. De onde vinha e para onde se dirigia essa música? Numa síntese de apreciações já assimiladas, pode dizer-se, como Stuckenschmidt, que «o que faz da Sagração uma obra única é a fusão de elementos que parecem remontar aos primeiros tempos do mundo e ao modernismo mais avançado».

Por conseguinte, o «moderno» assume a máscara ou a face do primitivo e do bárbaro. Para esta interpretação concorrem vários factores: o assunto do bailado, obviamente; o relevo que o ritmo possui, na música, facto que a nós, ocidentais, leva a pensar imediatamente nas culturas africanas consideradas primitivas (por isso, em relação à Sagração, se falou mesmo de «terror negro»); o uso obsessivo da repetição que substitui as técnicas mais elaboradas da variação e do desenvolvimento; a atenção insistente e «primordial» aos sons em si próprios.

Para a cultura erudita, dizer «primitivo e bárbaro» implica algo de negativo: a perda de uma densidade de elaboração cultural sem contrapartida visível no mesmo plano. Um respeitável porta-voz deste ponto de vista é sem dúvida Adorno, para quem Stravinsky personifica a regressão, na medida em que, na Sagração, «a selvagem representação do selvagem satisfaz o anseio de liquidar a aparência social, o impulso para a verdade».

Os escândalos culturais têm frequentemente uma duração efémera e todos os «modernos», mais cedo ou mais tarde, se tornam «clássicos». Seria interessante ver até que ponto o moderno da Sagração continua a ser desagradável para os nossos contemporâneos menos cultos mas recordemos que, entretanto, os mass media derramaram, nos ouvidos dos povos, tantos ruídos, no sentido físico e no sentido cibernético, e a música de Stravinsky tem sido tão filtrada pelos grandes e pelos pequenos écrans, que reacções primárias como aquela que relatámos não podem deixar de admirar.

Para o público e para a crítica oficial de Paris, a «reabilitação» desta obra não tardou: um ano depois, foi executada em forma de concerto, isto é, sem bailado. «Para a Sagração», escreve ainda Stravinsky nas Crónicas da minha vida, «foi uma esplêndida reabilitação. A sala estava repleta. O público, já não distraído pelo espectáculo, ouviu o meu trabalho com uma atenção concentrada e aplaudiu-o com um entusiasmo que me emocionou muito e que estava longe de esperar. Alguns críticos, que anteriormente tinham depreciado a Sagração, confessaram abertamente o seu erro». Admitindo que essa conversão fosse autêntica — isto é, que a compreensão não passasse de mero hábito — as suas razões são naturalmente complexas e não tencionamos analisá-las aqui.

Pelo contrário, o que nos interessa é revelar, em conclusão, como a ligação com o ballet foi e continua a ser importante, em todos os sentidos, para esta música. Como o mítico e poético fauno mallarmiano para Debussy, a visão ritual que a cenografia derrama sobre a música leva, contrariamente ao que Stravinsky pensava, a aceitar inovações musicais que, de outro modo, seriam menos aceitáveis. Se virmos com atenção, aquilo que uma lógica tradicional do discurso musical considerava grosseiro e primitivo na Sagração, era uma gestualidade musical, ou melhor, músico-dramático semelhante à do Verdi popular (que Stravinsky tanto apreciava) e que, mais tarde, virá a ser a poética de um Berio (em óptimas relações tanto com Verdi como com Stravinsky).

Ora, se esta música traduz e sugere — hoje como na sua época — o primitivismo bárbaro do bailado «com uma força e uma capacidade de representação únicas», como escreve Gentilucci, isso não fica a dever-se ao facto de o revolucionário músico ter inventado tudo, como acontece hoje com algumas obras que, baseadas em códigos particularíssimos, são impenetráveis para o grande público. Em nossa opinião o «primitivo» stravinskiano resulta, sim, do facto de o músico apelar para arquétipos gerais e também pré-musicais que são fundamentais na nossa cultura e que, mais ou menos, todos nós cultivamos. Arquétipos que aliam estruturas rítmicas, dinâmicas, de timbre, etc., a determinados campos da experiência sensorial e intelectual. Por exemplo, uma massa sonora em registo grave surge aos nossos ouvidos como sombria; se essa massa for composta por sons que não distinguimos, torna-se tenebrosa e se, ainda por cima, for forte e cheia de ressonâncias, torna-se ameaçadora. A Sagração está repleta de situações sonoras deste género, situações inventadas pelo autor, e por isso não codificadas antecipadamente, mas que nós interpretamos como interpretaremos qualquer acontecimento natural ou cultural novo que se nos apresentem: com os meios que possuímos.

É baseando-se nesses meios que o próprio Stravinsky organiza, com uma margem de invenção, é certo, os materiais sonoros tradicionais, criando assim uma música nova em muitos aspectos. E é precisamente esse recurso aos códigos comuns, transpondo os mais especificamente musicais, que constitui talvez o principal motivo de escândalo de 1913 para as elites culturais, ao mesmo tempo que constitui seguramente a razão dessa impressão de vitalidade e de actualidade que a obra continua a exercer sobre o público. É assim que esta música tem um sentido de «primitivo», isto é, de arquétipo; um sentido que o bailado acaba por justificar mas também por limitar de modo que sabemos.

Se a Sagração da Primavera já não choca, não deixou todavia de ser uma proposta que se mantém em aberto e uma proposta feita ao público, isto é, a todos os utentes dos códigos de base. Procuremos em conjunto o «moderno» da Sagração, ou seja, a origem de tantos dos nossos comportamentos culturais de fundo, para além da linguagem musical tradicional — uma origem relativa e histórica, entenda-se. Assim ficará mais aberto o caminho para a compreensão, numa segunda fase, da contribuição original de Stravinsky para a nossa cultura, contribuição que precisaremos melhor com a ajuda dos especialistas.

(Gino STEFANI - Compreender a música. Lisboa: Presença, 1987, p. 78-84)

O significado d'A Sagração da Primavera de Stravinsky
breves notas

"Sou o veículo através do qual passou A Sagração da Primavera", disse Stravinsky, porque ele próprio sabia que A Sagração da Primavera não era só a sua obra mais importante, mas uma obra crucial da história da música, como a sinfonia "Heróica", os últimos quartetos de corda de Beethoven e Tristão e Isolda de Wagner. Para a música europeia, marcou o fim do predomínio dos séculos de tradição germânica, e do predomínio milenar da melodia e da harmonia sobre o ritmo. Nas vésperas da Primeira Guerra Mundial, A Sagração libertou os impulsos musicais selvagens, subliminares que pressagiavam a história posterior do nosso violento século. Stravinsky concebeu a obra em 1910, quando, segundo as suas palavras, "sonhou com uma cena de ritual pagão em que uma virgem eleita para o sacrifício dança até morrer". A maior parte da música foi composta em 1911. "Não me guiava por nenhum sistema... Quando penso na música de outros compositores que me interessava naquela época -- a música de Berg, que é sintética (no melhor sentido), e a de Webern, que é analítica --, parece-me muito mais teórica do que a Sagração. E estes compositores pertenciam e eram apoiados pela grande tradição.

(A grande música passo a passo. Alfragide: Ediclube, volume dedicado a Stravinsky)
Fonte:http://ocanto.esenviseu.net/destaque/strvnsk2.htm


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EDUCAÇÃO MUSICAL NAS ESCOLAS BRASILEIRAS:

Teresa da Assunção Novo Mateiro

Breve Retrospectiva Histórica

No Brasil, a educação musical passou por uma trajetória lenta e reformista, observando-se as mais diversas concepções referentes ao ensino da música. Por exemplo, com a queda do sistema Republicano em 1930, instalou-se uma política educacional nacionalista e autoritária que utilizou a música para desenvolver a "coletividade", a "disciplina" e o "patriotismo". É durante esse período que se dá a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas primárias e secundárias (Decreto nº 19891, de 11 de abril de 1931), refletindo um momento de transformação liderado por Villa-Lobos. A esse respeito cita-se o pensamento de Souza (1992):
"a idéia sobre a educação musical na literatura dos anos trinta é muito diferenciada e por vezes contraditória. Especialmente são colocados objetivos sócio-políticos muito gerais como educação musical a serviço da coletividade e unidade nacional, o despertar do sentimento de brasilidade ou ainda disciplina social, que no entanto não são em lugar algum claramente definidos mas apenas vagamente descritos" (p.13).

Após a Segunda Grande Guerra, surge o movimento Música Viva, liderado por Hans-Joachim Koellreuter, o qual defendia o "combate pela música que revela o eternamente novo, isto é: por uma arte musical que seja a expressão real da época e da sociedade". Este movimento foi apoiado por uma importante geração de compositores brasileiros, entre os quais Cláudio Santoro, César Guerra Peixe, Edino Krieger, Heitor Alimonda e Eunice Katunga, que posteriormente seguiriam caminhos diversos.

O movimento Música Viva teve também sua participação na educação musical brasileira. Ressaltam-se aqui os pontos essenciais: (a) o privilégio da criação musical; (b) a importância da função social do criador contemporâneo; (c) a questão do coletivo; (d) a contemporaneidade e renovação (KATER, 1992). De excertos (transcritos por Kater) do capítulo "Da educação artística, de uma mentalidade nova, de um novo estilo" do Manifesto de 1945, extrai-se parte do pensamento do Grupo Música Viva referente ao ensino de música:

"1. educar a coletividade utilizando as inovações técnicas a fim de que ela se torne capaz de selecionar e julgar o que de melhor se adapta à personalidade de cada um dentro das necessidades da coletividade; 2. combater o ensino baseado em opiniões pré-estabelecidas e preconceitos aceitos como dogmas; 3. reorganizar os meios de difusão cultural. (...) Consideramos essencial a substituição do individualismo e do exclusivismo pelo coletivismo em música, preconizamos para o ensino musical as formas coletivas de ensino: canto orfeônico e conjunto instrumental" (Ibid, p.24-5).

Depois de diversas práticas influenciadas por "movimentos educacionais e estéticos, demonstrando práticas rígidas e flexíveis, especializadas e integradas, unimetódicas e ecléticas, tradicionais e inovadoras" (OLIVEIRA, 1992, p.38), a educação musical brasileira nos anos 60 viveu tendências que ressaltavam a sensibilidade, criação e improvisação. Discute-se o que é sensibilizar e musicalizar e afirmam-se palavras-chave como Iniciação Musical, Musicalização, Arte-Educação, Sensibilização, Métodos.

Em 1971, a música passou a fazer parte de um ensino interdisciplinar, com base no artigo 7º da Lei 5692 de 1971. Com esta reforma, a Educação Artística foi introduzida nos currículos escolares de I e II Graus, trazendo problemas para o ensino da música, bem como para as outras artes (artes plásticas e artes cênicas). A partir de 1971, o professor de Educação Artística ficou responsável por uma prática pedagógica polivalente. Conseqüentemente, aqueles profissionais que tinham formação na área da música davam aulas de música e, esporadicamente, pincelavam tentativas com atividades de artes plásticas e artes cênicas. Entretanto, aqueles professores que não tinham formação em música acabavam ministrando aulas apenas nas outras áreas.

Por outro lado, os cursos de Licenciatura em Educação Artística ofereciam disciplinas nas três áreas, disto resultando uma aprendizagem rápida e superficial. Vale ressaltar que a maioria dos alunos que ingressava nesses cursos não possuía nenhuma formação prévia em qualquer das áreas, criando-se assim um "exemplo típico de um círculo vicioso: o aluno não possui educação musical a nível de I e II Graus, conseqüentemente chega nas graduações sem muito conhecimento prévio, e retorna como professor sem muitas condições de desenvolver um ensino apropriado de música" (HENTSCHKE, 1993, p.52). Depois de formado, o professor procura fazer o concurso público que, de acordo com a Lei nº 5692/71, lhe permite ministrar aulas apenas da 5ª à 8ª série do I Grau ou no II Grau. Dessa forma, as séries primárias foram as primeiras a ficar sem professor especializado e, de um modo geral, o ensino de música nas escolas parece estar desaparecendo gradualmente.

A educação musical tornou-se, então, privilégio de uns poucos, pois a maioria das escolas brasileiras aboliu o ensino de música dos currículos escolares devido a fatores como a não-obrigatoriedade da aula de música na grade curricular e a falta de profissionais da área, somando-se a isso os valores culturais e sociais que regem a sociedade brasileira. As raras instituições de ensino que ainda preservam a música no programa curricular oferecem uma carga horária mínima e, nessa situação caótica, ainda encontra-se a problemática da prática pedagógica da educação musical (BEYER, 1993). Na grande maioria das vezes, segundo Santos (1994), as aulas restringem-se ao trabalho de "eventos culturais objetivando culminâncias que, embora altamente motivadoras, vêm em nome de um produto, sacrificando um processo" (p.10). E a autora prossegue mencionando que os professores aceitam a função de "festeiro, preparador de hinos; encaram o trabalho artístico e musical como auxiliar pedagógico para fixação de conhecimentos de outras disciplinas; justificam o trabalho artístico e musical como momento de liberação emocional e/ou relaxamento para o desenvolvimento em processos cognitivos desenvolvidos em outras disciplinas do currículo" (Ibid).

Nesse sentido, é pertinente o pensamento de Tourinho (1993b): "vista como uma ‘mera’ disciplina, a música não é tratada como um tipo de conhecimento a ser ensinado, estudado, compreendido e recriado" (p.68). Mas por outro lado, continua a autora, a música está sempre presente nos rituais do ambiente escolar, seja nas festas e celebrações, seja na "organização e validação do tempo e do espaço das ações que acontecem no dia-a-dia escolar" (Ibid., p.69).

Esta situação, sem dúvida, reflete os valores ideológicos e filosóficos que a educação musical possui para a nossa sociedade. Educação, cultura, arte tornaram-se superficialidades, e apenas aqueles com condições financeiras para pagar professores particulares de música (mais especificamente de um instrumento musical) ou de qualquer outra área têm acesso a outras modalidades de conhecimento. Segundo Hentschke (1993b), essa atitude que privilegia uma pequena parte da população brasileira, "contradiz todo e qualquer princípio educacional" (p.52).

Outro aspecto a ser considerado, além da ineficiente formação dos professores, é a falta de embasamente teórico que fica explícita em suas práticas, o que promoveria o direcionamento a uma filosofia pedagógica. É comum, por parte dos professores, a procura de atividades prontas, as famosas ‘receitas’. As aulas limitam-se a uma seqüência de atividades escolhidas a esmo ou então adota-se algum método gerado no Brasil (Villa-Lobos, Gazzi de Sá, Liddy Mignone e Sá Pereira) ou algum método trazido da Europa — o que é o mais comum — (Dalcroze, Orff, Kodaly, Willems, Martenot), métodos estes que por muito tempo serviram, e ainda servem, de modelo na prática educacional. A esse respeito, cita-se a contribuição de Penna (1990):

"No entanto, não podemos esquecer que esses métodos carregam uma concepção de música e de mundo. Podemos nos reapropriar de exercícios dos vários métodos, na condição de, compreendendo os princípios que os embasam, redirecioná-los para as metas que almejamos. O problema, afinal, é não tomar esses métodos como um conjunto de técnicas a reproduzir, consagradas pela assinatura de seu autor, e portanto capazes de garantir, em todos os níveis, a nossa prática. Nem a prática nem qualquer método devem estar imunes a questionamentos, que são, inclusive, o motor de um constante aprimoramento" (p.66).

Observa-se ainda o crescente número de materiais pedagógicos. Começa a aparecer uma variedade de livros didáticos para os mais diversos instrumentos, bem como para a Educação Musical. Entre eles, citam-se, por exemplo: "Meu Piano é Divertido" (1976); "Explorando Música através do Teclado" (1989); "Iniciação Musical com Introdução ao Teclado" (1990); "Criando e Aprendendo" (1973); "Pedrinho Toca Flauta: uma iniciação musical através da flauta doce para crianças" (1985).

Os livros surgem como uma estratégia de melhoria da qualidade de ensino, como um mecanismo de modernização ao invés da modificação de planos e programas de estudo. A esse processo, Torres (1994) chama de "tecnologia educativa" e, além de falar sobre o aspecto positivo dos livros no rendimento escolar, a autora posiciona-se da seguinte maneira: "(...) a maior participação docente e a maior autonomia pedagógica que hoje se reivindica para os professores, resgatando seu papel técnico e profissional, contradiz essencialmente a dependência, cada vez maior, do livro escolar como resposta às suas fraquezas" (p.24).

Apesar de Torres (1994) referir-se ao livro escolar em especial, sua posição é bastante pertinente e adequada também ao professor de música, assim como se pode observar através do pensamento de Santos (1994): "a ênfase no tratamento do ensino musical através da experimentação gerou a fase do livro didático, em que a ‘experimentação’ do fenômeno musical é prevista passo a passo" (p.10). Esse procedimento didático é observado tanto na prática dos professores de instrumento quanto na dos professores de educação musical.

Os professores de instrumento escolhem determinados livros e durante anos tendem a repetir as mesmas estratégias de ensino, o mesmo repertório. De acordo com Santiago (1994), existe nesses professores "uma tendência à acomodação aos processos por meio dos quais eles próprios foram educados, sem uma exploração de novos métodos". E a autora continua: "ocorre inclusive uma acomodação ao repertório padrão, e ouvem-se dezenas de alunos a repetirem as mesmas obras anos após anos, como se só aquelas existissem fomentando um ‘mesmismo’ generalizado" (p.226). Por outro lado, o professor de educação musical reproduz atividades extraídas de métodos, assim como afirma Santos, ao comentar a experiência musical brasileira nos últimos anos:

"Foi imediata a adoção de séries de exercícios com o fim de facilitar a aprendizagem de elementos expressivos da linguagem musical (embora desligados de um fazer próprio do grupo, da forma de organização da linguagem no novo contexto sócio-cultural), exercícios esses isentos de dimensão estética e musical, que fragmentam a experiência artística destituindo-a de unidade e sentido. (...) Pouca ou nenhuma reflexão ocorreu sobre os pressupostos filosóficos e psicológicos desses métodos, as bases sócio-culturais sobre as quais foram construídos ou sua abrangência como experiência pedagógica" (1994, p.10).


Tendências Pedagógicas Atuais

Apesar de no Brasil haver uma carência de estudos que tratem da prática da educação musical em sala de aula, pode-se afirmar que existem linhas filosóficas educacionais por vezes não declaradas que estão diretamente relacionadas à ação pedagógica dos professores. De acordo com Libâneo (1987), "uma boa parte dos professores, provavelmente a maioria, baseia sua prática em prescrições pedagógicas que viram senso comum, incorporadas quando de sua passagem pela escola ou transmitidas pelos colegas mais velhos; entretanto, essa prática contém pressupostos teóricos implícitos" (p.19).

Fonterrada (1993), ao analisar a situação da música no Brasil a partir de 1971, lembrando as modificações estruturais que ocorreram com o ensino da música nas escolas, ressalta que duas linhas pedagógicas podem ser identificadas, as quais a autora denomina de ‘tradicional’ e ‘alternativa’. A tradicional, segundo Fonterrada, "aproxima-se do modelo de educação tecnicista e tem por objetivo a formação de instrumentistas, cantores, compositores e/ou regentes" (p.78). Os profissionais que seguem essa linha defendem a música como privilégio somente daqueles bem dotados musicalmente, importam valores e procedimentos de outros países sem refletir sua adequação para o ensino brasileiro, enfim, cultivam um passado, tendo dificuldades de acompanhar as novas propostas que surgem na área.

A educação musical ‘alternativa’, conseqüência da prática da Educação Artística, advoga a música como uma prática de todos, amparando-se nos pressupostos filosóficos da corrente pedagógica ativa, ou seja, centrada na iniciativa e nos interesses dos alunos. Inserida num modelo teórico naturalista, a prática educacional da música, assim como assinala Fonterrada (1993), ressalta a "ampliação do universo sonoro, expressão musical através da vivência e da experimentação livre, liberação das emoções, valorização do folclore e da música nacional" (p.79).

As duas linhas pedagógicas — tradicional e alternativa — detectadas por Fonterrada (1993) assemelham-se às linhas mencionadas por Swanwick (1988) quando o autor se refere às teorias de educação musical identificadas nas escolas inglesas. A linha pedagógica tradicional fundamenta-se nos mesmos princípios da teoria também denominada de tradicional, enquanto que a alternativa corresponde à teoria progressista, ambas concebidas com as mesmas características.

Na Inglaterra, com o intuito de verificar cuidadosamente a prática musical curricular, foi realizado, por Swanwick (1988), um estudo em 60 escolas, entre 1985 e 1987. O pesquisador pôde detectar uma grande variedade de atividades em sala de aula, as quais pareciam ser determinadas pelos princípios teóricos e pedagógicos de cada professor. Não existia, portanto, continuidade e sistematização na prática curricular do ensino de música nas instituições de ensino.

A partir da diversidade de propostas de aprendizagem realizadas nas aulas de música, Swanwick (1988) verificou que tais atividades poderiam ser classificadas em "três bases lógicas rivais", quais sejam: a ‘tradicional’ ou ‘centrada na matéria’, a ‘progressista’ ou ‘centrada na criança’ e a ‘multicultural’. Essas teorias que tentam classificar as correntes pedagógicas na prática escolar têm sido utilizadas, por muitos pedagogos, como instrumento de análise da prática docente. São fundamentadas nas teorias de educação já existentes.

A teoria tradicional de educação caracteriza-se pelo predomínio do ensino dirigido, onde o professor transmite ao aluno informações, consideradas apropriadas, referentes a determinados assuntos, os quais devem ser memorizados. Cabe ao professor a seleção do que, como e quando o aluno vai aprender, bem como a seleção do material pedagógico. Não se questiona o porquê de tal aprendizagem. "Os conteúdos, os procedimentos didáticos, a relação professor-aluno não têm nenhuma relação com o cotidiano do aluno e muito menos com as relações sociais. É a predominância da palavra do professor, das regras impostas, do cultivo exclusivamente intelectual" (LIBÂNEO, 1987, p.22).

No ensino da música predominam atividades como o desenvolvimento da leitura da notação musical, a aprendizagem de habilidades específicas para tocar um instrumento e informações acerca das ‘melhores músicas’ e dos ‘melhores compositores’ dos diferentes períodos da história da música. Em geral, ocorre um ensino fragmentado, sem que exista uma relação entre os assuntos estudados, ou seja, existe uma desvinculação bastante significativa entre a teoria e a prática. A abordagem adotada está relacionada à psicologia ‘mecanicista’ (ou psicologia associacionista, em vigor no século passado), onde a preocupação está centrada no resultado, não no processo que ocorre durante a aprendizagem (BIGGE, 1977).

Em contraposição à teoria tradicional, a progressista valoriza a auto-educação, preocupando-se mais com os processos mentais e habilidades cognitivas do que com a organização racional dos conteúdos (LIBÂNEO, 1987). O ensino é centrado no aluno e no grupo, ressaltando-se o desenvolvimento das aptidões individuais. Volta-se para a compreensão da natureza psicológica da criança, pois suas necessidades e interesses são importantes para que ela se adapte com facilidade ao meio. O professor agora tem o papel de auxiliar o desenvolvimento livre e espontâneo da criança, atentando também para manter um relacionamento positivo com o aluno.

Vários educadores musicais desenvolveram idéias semelhantes, baseadas nesses princípios educacionais, as quais podem ser observadas com freqüência na prática educacional dos professores de música tanto de escolas inglesas quanto de escolas americanas. Carl Orff, o primeiro pedagogo progressista (Swanwick, 1988), enfatizou a participação efetiva do aluno através de sua experiência na execução de instrumentos musicais, canto, treinamento auditivo, movimento e improvisação. Defendeu a prática antes da teoria, não se preocupando com a segunda questão. Para Orff, a música é o resultado natural da fala, do ritmo e do movimento, estabelecendo-se assim a tríplice aliança artística, igualmente almejada por ele — música, dança e drama (CHOSKY et al., 1986) O importante é a criança vivenciar, fazer música dentro de um grupo até criar suas próprias manifestações sonoras e ir tomando consciência de conjunto a cada etapa do processo.

Na mesma linha filosófica, cita-se também John Paynter na Grã-Bretanha, Murray Schafer no Canadá e, nos Estados Unidos, o Programa Curricular de Música Manhattanville (1970), planejado por Ronald Thomas (SWANWICK, 1988). John Paynter e Murray Schafer enfatizam o trabalho de composição como base para a educação musical nas escolas. Estes autores defendem o desenvolvimento da criatividade através da exploração e organização de qualquer material sonoro (PAYNTER, 1970; SCHAFER, 1967). A obra de Paynter, assim como a de Schafer, descreve inúmeras experiências obtidas em sala de aula, resultando num material de sugestões para professores. Contudo, Schafer (1991) faz uma advertência em relação à sua obra, dizendo que esta "é um relato pessoal de um educador musical e não o enunciado de um método para a imitação submissa" (p.14).

Por sua vez, o Programa Curricular de Música Manhattanville (1970) enfoca três aspectos principais que, de alguma forma, também estavam presentes no trabalho de Paynter e Schafer. São eles: (a) a relevância artística, ou seja, música como arte; (b) a relevância pessoal, considerando a relação das necessidades musicais dos alunos com a satisfação das mesmas; (c) a relevância social, focando a cultura, o meio e as mudanças passíveis de ocorrer ao longo do processo de movimento da sociedade.

A orientação para o ensino de música, durante as décadas de 60 e 70 na Inglaterra e nos Estados Unidos, fundamenta-se, portanto, no desenvolvimento da criatividade, da experimentação e da auto-expressão, alcançadas através de atividades de improvisação e composição. Nesse processo, o trabalho centra-se quase que exclusivamente na manipulação e experimentação dos mais diferentes materiais, utilizando-se desde o som de papéis, plásticos, vidros, enfim, material de sucata em geral, até o som de sintetizadores e computadores. Ao professor compete orientar o aluno, facilitando o processo de aprendizagem, "estimulando, questionando, aconselhando e auxiliando, ao invés de demonstrar e dizer" (SWANWICK, 1988, p.14).

A terceira teoria da educação musical citada por Swanwick (1988) é a teoria multicultural, a qual, segundo o autor, está relacionada à diversidade cultural encontrada nas sociedades, resultante tanto do crescimento da migração e imigração das mais diversas culturas quanto do desenvolvimento dos cada vez mais eficientes meios de comunicação. Não há dúvida de que as preferências musicais são sinais culturais, e os processos de rotular a música e de colocá-la dentro de um contexto de aprovação social são universais e podem ser encontrados dentro de qualquer categoria de tradições ocidentais clássicas ou folclóricas. Conseqüentemente, a fusão da música com a cultura e o estilo de vida em geral dá-se de acordo com os costumes culturais óbvios, ou seja, costumes e práticas religiosas, políticas ou de qualquer outra categoria (Ibid.,1988).

De acordo com a linha de pensamento multicultural, o papel da educação é evitar, ou pelo menos reduzir, a rotulação e a estereotipação cultural através de um maior contato com diferentes manifestações musicais, fazendo com que os alunos vivenciem experiências construídas a partir de elementos independentes de vinculação cultural. A principal tarefa do professor refere-se à escolha do repertório. Conforme Swanwick (1988), o educador tem a responsabilidade de tornar familiares aos estudantes as diferentes convenções estruturais presentes nos diversos idiomas musicais, ou seja, mostrar como as idéias musicais podem ser estabelecidas e transformadas através dos diversos modos de repetição e contraste.

Hentschke (1993b) entende que, além das três bases educacionais expostas até aqui, ainda uma outra está presente na ação pedagógica dos professores de música, a qual a autora denomina de Teoria Psicológica (p.62) e que se refere aos processos cognitivos envolvidos na aprendizagem do pensamento musical. Desde o final do século passado educadores musicais e psicólogos vêm pesquisando como a música é processada pelo indivíduo e que efeitos psicológicos exerce sobre ele (Ibid., p.63). Por outro lado, poucos estudos foram realizados sobre o desenvolvimento musical relativamente ao crescimento físico e intelectual do indivíduo. Uma das tentativas mais recentes é a Teoria Espiral de Desenvolvimento Musical de Keith Swanwick (1988), que enfoca a maneira pela qual ocorre o conhecimento e a compreensão musicais em cada indivíduo. O autor propõe uma seqüência específica referente ao desenvolvimento musical da criança, adolescente ou adulto. Hentschke (1993b) reforça a posição de Swanwick observando que o Modelo Espiral pode servir de "suporte para o desenvolvimento curricular" e também como "critério para avaliação dos produtos musicais" (p.64).

Uma prática educacional baseada nos princípios da Teoria Psicológica, segundo Hentschke (1993b), deverá preocupar-se com "os processos cognitivos, idade psicológica da criança, e o que ela é capaz de aprender, musicalmente falando, de acordo com sua idade mental, psicomotora e afetiva" (p.64). Um currículo estruturado dessa forma propiciaria melhores condições de aprendizagem musical, pois estaria em conformidade com o desenvolvimento físico e psicológico da criança.

Além da abordagem pedagógica, outros fatores adicionam-se ao contexto das aulas de música nas escolas brasileiras. Fala-se da carga horária reduzida que é oferecida para o ensino da música. Na maioria das escolas que oferecem aulas de música, estas são ministradas uma vez por semana num período que varia de quarenta minutos a uma hora. Não há dúvida que esse intervalo de tempo é insuficiente para que se realize um trabalho sólido e consistente. Outro fator importante são os recursos materiais adequados — espaço físico, instrumentos musicais, aparelho de som, computador, entre outros — para desenvolver-se um trabalho diversificado. Conforme Swanwick (1994), as aulas de música estão muito aquém dos avanços tecnológicos do século XX. Discos, rádio, televisão, computadores, instrumentos musicais (teclados eletrônicos, por exemplo) proporcionam mais recursos para o acesso à música de todos os tipos e lugares. Fora da escola as práticas musicais crescem em função da tecnologia de sons materiais, apresentando uma grande diversidade, desde a música experimental, minimalista, até a música popular., Dentro das escolas, ao contrário, parece que a prática musical está baseada em escalas pentatônicas e sons que aparentemente não fazem parte da vida dos alunos.

A partir da exposição feita até aqui, constata-se a preocupação, não só no Brasil mas também em outros países, com os princípios teóricos e pedagógicos que regem o ensino da música nas escolas. No Brasil, a reflexão e o debate sobre o tema aumentam de importância em razão da falta de planejamento e sistematização, dois aspectos que têm sido insuficientes na formação musical dos alunos. Da mesma forma, a luta para que a música seja uma matéria fundamental e obrigatória no currículo escolar das escolas brasileiras tem sido tema de discussão nos Encontros Nacionais de Educadores Musicais.


Conclusão

Refletindo-se sobre a situação da educação musical no Brasil, verifica-se que vários são os fatores que impedem a formação de uma sociedade musicalmente educada. Inicialmente, ressalta-se o fato do ensino de música não ser obrigatório nas escolas, sendo que, em conseqüência, apenas algumas escolas, em geral as particulares, mantêm professores especializados. No ano de 1987, Hentschke (1993b) realizou uma pesquisa em 148 escolas de 6 municípios do estado do Rio Grande do Sul e detectou que 89% das instituições de ensino não oferecia educação musical. Acredita-se que essa situação repete-se nas demais regiões do país. Conclui-se, portanto, que a maioria dos estudantes, quando termina o II Grau, não têm conhecimentos musicais básicos, o que acarreta uma sociedade de pessoas incapazes de analisar e selecionar criticamente as músicas que se apresentam no contexto cultural da sociedade moderna.

A formação dos professores é um outro aspecto, sobre o qual pode-se verificar que não existem modelos de referência única, mas, ao contrário, o que há é uma formação que se tornou multifária e pluralista, muito embora persistam referências básicas de preparação técnica e de exigências ética e educacional. O certo, porém, é que a sempre crescente complexidade do ensino da música em nosso tempo, bem como a dificuldade de compreensão das relações sociais e dos comportamentos humanos diante dos valores em transformação, as linhas filosóficas, sociológicas e psicológicas que permeiam o sistema educacional compõem um conjunto de fatores que torna o exercício da função de educador musical sempre mais difícil, não se justificando assim, em hipótese alguma, confiar esse múnus a quem não possua efetiva preparação profissional. Dessa forma, os professores devem procurar realizar uma reflexão crítica permanente, bem como acompanhar as mudanças no sistema educacional e as novas manisfestações musicais.

Como já discutido anteriormente, o quadro de referência das aulas de música é, sem dúvida, um fator que interfere diretamente na formação do indivíduo e, conseqüentemente, reflete o perfil do sistema educacional. Partindo do que foi analisado até aqui, pode-se dizer através das palavras de Beyer (1993) que a "falta de continuidade é outra deficiência no ensino de música. A prática da educação musical está desarticulada, inexiste a idéia da construção de uma seqüência com um fio condutor em sua essência" (p.16). Assim, os profissionais da área têm sentido a necessidade de uma maior estruturação curricular que possa sistematizar a efetivação de uma prática de educação musical coerente.

No Brasil, a elaboração e implantação de currículos de educação musical geralmente fica restrita a repartições de ensino específicas, sem que haja a divulgação de tais trabalhos. Daí que, apesar de existirem trabalhos nesse sentido, pode-se dizer que não existem currículos-base publicados que orientem a ação pedagógica dos educadores musicais, algo que pode ser observado na prática de outros países. Como Tourinho (1995) constata: "não existe um levantamento de dados sobre onde, como, sob que orientação e programa este ensino acontece" (p.39). Registra-se, portanto, a necessidade da sistematização do ensino de música nas escolas brasileiras através de programas curriculares correspondentes e adequados aos mais diversos fatores que interferem no sistema escolar.



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